segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Assembleia dos Movimentos Sociais convoca marcha global


Cerca de 1,5 mil pessoas de 30 países participaram da plenária dispostas a enfrentar dois dos grandes desafios impostos à esquerda mundial.


Em 5 de junho, Dia Internacional do Meio Ambiente, os movimentos sociais de todo o mundo vão ocupar as ruas em uma grande jornada de mobilização global contra o capitalismo e em defesa da justiça ambiental e social. A agenda foi aprovada neste sábado (28), na Assembleia dos Movimentos Sociais, realizada durante o Fórum Social Temático, em Porto Alegre.



A jornada terá o propósito de demarcar a posição dos movimentos sobre as questões ambientais e sociais que serão discutidas, 15 dias depois, na Rio + 20, pelos chefes de estado dos 192 países que participam da Organização das Nações Unidas (ONU).



“A tentativa de esverdeamento do capitalismo, acompanhada pela imposição de novos instrumentos da ‘economia verde’, é um alerta para que nós, dos movimentos sociais, reforcemos a resistência e assumamos o protagonismo na construção de verdadeiras alternativas à crise”, dizem as entidades, no documento que aprovaram no encontro.



Cerca de 1,5 mil pessoas de 30 países participaram da plenária dispostas a enfrentar dois dos grandes desafios impostos, hoje, à esquerda mundial: construir uma pauta unificada de lutas e mobilizar as populações para garantir a imposição de derrotas reais ao capital.



O primeiro, foi cumprido. Apesar das diversas propostas, os movimentos conseguiram definir eixos comuns para a luta. O segundo desafio dependerá da capacidade de mobilização em cada país.



“Temos que ser mais criativos para envolver as massas. Sem isso, não teremos força para derrotar o capitalismo nesta crise que assola os povos do mundo”, provocou um dos coordenadores da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, na abertura da plenária.



De acordo com ele, o mundo vivencia a mais grave e longa crise econômica da história, o poder decisório se desvinculou do poder político para se concentrar nas mãos do capital e a burguesia continua controlando os meios de comunicação, utilizando-os para manipular os trabalhadores, cada vez mais desmobilizados. “As massas de trabalhadores estão apáticas. E esse é um problema nosso, que temos que enfrentar”, afirmou.



Nos discursos dos representantes das entidades nacionais e internacionais, ficou evidenciado o quanto a unificação da agenda e a priorização dos eixos defendidos não é uma tarefa fácil.



O sindicalista cubano José Miguel, representante da Central de Trabalhadores de Cuba (CTC), ressaltou a necessidade de construção de alternativas e propostas dos movimentos sociais para a Cúpula dos Povos, a conferência que os movimentos sociais realizarão paralela à Rio + 20.



O secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores da Argentina (CTA), Carlos Chile Huerta, citou o processo de recessão mundial para ressaltar a importância da rearticulação do campo popular para reposicionar o poder político no continente nas mãos dos trabalhadores.



O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Daniel Iliescu, criticou a distribuição do orçamento federal. “Temos que acabar com crime de destinar quase 50% do orçamento do governo para o pagamento da dívida pública. Queremos 10% do PIB [Produto Interno Bruto] para a Educação”, afirmou.



Representando a Organização Infanto-Juvenil Sementes da Pátria, da Venezuela, o estudante Luiz Ramirez defendeu prioridade para a luta contra o imperialismo norte-americano. “A América Latina, em especial, vive um momento muito rico, com governos de esquerda, e precisa articular ações de mobilização para avançar rumo ao socialismo.”



Membro da Coordenação Internacional do Comitê Internacional Palestina Livre e líder de uma organização de boicote a Israel, Jamal Juma pediu apoio prioritário à luta histórica pela soberania do país, há 63 anos ocupado por tropas israelenses. Segundo ele, haverá uma grande mobilização mundial em 29 de novembro pela causa palestina.



O argentino Manoel Bertoldi, da Frente Popular Dario Santilhan, lembrou da importância da luta internacionalista e cobrou apoio à luta do povo hondurenho pelos direitos humanos.



Pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, o cacique Uilton Tuxá cobrou o reconhecimento das etnias como povos originários. “Não queremos ser tratados nem como selvagens e nem como mestiços”, afirmou.



Representando a Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde, Maria Valéria Costa Correa retomou a defesa dos princípios da reforma sanitária, que propõe saúde pública e universal. “Precisamos defender o maior sistema público de saúde do mundo, que é o brasileiro”, disse ela.



O líder sindical tunisiano Alaa Talbi dividiu com os presentes a experiência que vivenciou durante a Primavera Árabe e destacou a importância da democratização dos demais países árabes, com o fim da corrupção, a garantia de emprego e direitos sociais e emancipação da mulher.



Representando a Central Única dos Trabalhadores (CUT), Rosane Bertotti explicou que o documento final lista bandeiras comuns aos movimentos, como a defesa do desenvolvimento sustentável e solidário, da reforma agrária, da agricultura familiar, do trabalho decente, da luta pela educação e pela saúde.



“Rejeitamos a forma como o capitalismo se reinventa na proposta de uma economia verde. Entendemos que, para mudar a realidade, não é só pintar de verde, é garantir direitos, liberdade de organização, democracia, proteção social”, disse.



Leia abaixo a Declaração da Assembléia dos Movimentos Sociais:



Declaração da Assembléia dos Movimentos Sociais

Porto Alegre (RS), Brasil



Nós, povos de todos os continentes, reunidos na Assembleia de Movimentos Sociais realizada durante o Fórum Social Temático Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental, lutamos contra as causas de uma crise sistêmica, que se expressa em uma crise econômica, financeira, política, alimentar e ambiental, colocando em risco a própria sobrevivência da humanidade. A descolonização dos povos oprimidos e o enfrentamento ao imperialismo é o principal desafio dos movimentos sociais de todo o mundo.



Neste espaço, nos reunimos desde nossa diversidade para construir juntos agendas e ações comuns contra o capitalismo, o patriarcado, o racismo e todo tipo de discriminação e exploração. Por isso reafirmamos nossos eixos comuns de luta, adotados em nossa assembléia em Dakar, em 2011:



Luta contra as transnacionais

Luta pela justiça climática e pela soberania alimentar

Luta para banir a violência contra a mulher

Luta pela paz e contra a guerra, o colonialismo, as ocupações e a militarização de nossos territórios



Os povos de todo o mundo sofrem hoje os efeitos do agravamento de uma profunda crise do capitalismo, na qual seus agentes (bancos, transnacionais, conglomerados midiáticos, instituições internacionais e governos servis) buscam potencializar seus lucros às custas de uma política intervencionista e neocolonialista. Guerras, ocupações militares, tratados neoliberais de livre comércio e “medidas de austeridade” expressas em pacotes econômicos que privatizam estatais, arrocham salários, reduzem direitos, multiplicam o desemprego e assaltam os recursos naturais. Tais políticas atingem com intensidade os países mais ricos do Norte, aumentam as migrações, os deslocamentos forçados, os despejos, o endividamento e as desigualdades sociais.



A lógica excludente deste modelo serve tão somente para enriquecer uma pequena elite, tanto nos países do Norte como nos do Sul, em detrimento da grande maioria da população. A defesa da soberania e da autodeterminação dos povos e da justiça social, econômica, ambiental e de gênero são a chave para o enfrentamento e a superação da crise, fortalecendo o protagonismo de um Estado livre das corporações e a serviço dos povos.



O aquecimento global é resultado do sistema capitalista de produção, distribuição e consumo. As transnacionais, as instituições financeiras, os governos e organismos internacionais a seu serviço não querem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Agora, tentam nos impor a “economia verde” como solução para a crise ambiental e alimentar o que, além de agravar o problema, resulta na mercantilização, privatização e financeirização da vida. Rejeitamos todas as falsas “soluções” para essas crises, como agrocombustíveis, transgênicos, geoengenharia e mercados de carbono, que são apenas novos disfarces do sistema.



A realização da Rio+20, no mês de junho no Rio de Janeiro, passados 20 anos da ECO 92, reforça a centralidade da luta por justiça ambiental em oposição ao modelo de desenvolvimento capitalista. A tentativa de esverdeamento do capitalismo, acompanhada pela imposição de novos instrumentos da “economia verde”, é um alerta para que os movimentos sociais reforcemos a resistência e assumamos o protagonismo na construção de verdadeiras alternativas à crise.



Denunciamos a violência contra a mulher, exercida regularmente como ferramenta de controle de suas vidas e de seus corpos, e o aumento da superexploração de seu trabalho, utilizado para amortecer os impactos da crise e manter a margem de lucros constantes das empresas. Lutamos contra o tráfico de mulheres e de crianças e o preconceito racial. Defendemos a diversidade sexual, o direito à autodeterminação de gênero e lutamos contra a homofobia e a violência sexista.



As potências imperialistas utilizam bases militares estrangeiras para fomentar conflitos, controlar e saquear os recursos naturais, e promover ditaduras em vários países. Denunciamos o falso discurso de defesa dos direitos humanos que muitas vezes justifica as ocupações militares. Manifestamos-nos contra a persistente violação dos direitos humanos e democráticos em Honduras, especialmente en el Bajo Aguan, o assassinato de sindicalistas e lutadores sociais em Colômbia e o criminoso bloqueio a Cuba – que completa 50 anos. Lutamos pela libertação dos cinco cubanos presos ilegalmente nos Estados Unidos, a ocupação ilegal das Ilhas Malvinas pela Inglaterra, as torturas e as ocupações militares promovidas pelos Estados Unidos e pela OTAN na Líbia e no Afeganistão. Denunciamos o processo de neocolonização e militarização que vive o continente africano e a presença da Africom. Nossa luta também é pela eliminação de todas as armas nucleares e contra a OTAN.



Expressamos nossa solidariedade com as lutas dos povos do mundo contra a lógica depredadora e neocolonial das indústrias extrativas e mineiras transnacionais, em particular, com a luta do povo de Famatina, na Argentina, e denunciamos a criminalização dos movimentos sociais.



O capitalismo destrói a vida das pessoas. Porém, a cada dia, nascem múltiplas lutas pela justiça social para eliminar os efeitos deixados pelo colonialismo e para que todos e todas tenhamos qualidade de vida digna. Cada uma destas lutas implica uma batalha de ideias o que torna imprescindíveis ações pela democratização dos meios de comunicação, hoje controlados por grandes conglomerados, e contra o controle privado da propriedade intelectual. Ao mesmo tempo, exige o desenvolvimento de uma comunicação independente, que acompanhe estrategicamente nossos processos.



Comprometidos com nossas lutas históricas, defendemos o trabalho decente e a reforma agrária como único caminho para dar impulso à agricultura familiar, camponesa e indígena e passo central para alcançar a soberania alimentar e a justiça ambiental. Reafirmamos nosso compromisso com a luta pela reforma urbana como instrumento fundamental na construção de cidades justas e com espaços participativos e democráticos. Defendemos a construção de outra integração, fundamentada na lógica da solidariedade e o fortalecimento de processos como a UNASUL e a ALBA.



A luta pelo fortalecimento da educação, da ciência e da tecnologia públicas a serviço dos povos, assim como a defesa dos saberes tradicionais se tornam inadiáveis, uma vez que persiste sua mercantilização e privatização. Diante disso, manifestamos nossa solidariedade e apoio aos estudantes chilenos, colombianos, porto-riquenhos e de todo o mundo que continuam em marcha na defesa de esses bens comuns.



Afirmamos que os povos não devem continuar a pagar por esta crise sistêmica e que não há saída dentro do sistema capitalista!



Encontram-se na agenda grandes desafios, que exigem que articulemos nossas lutas e que nos mobilizemos massivamente.



Inspirados na história de nossas lutas e na força renovadora de movimentos como a Primavera Árabe, o Ocuppy Wall Street, os “indignados” e na luta dos estudantes chilenos, a Assembleia dos Movimentos Sociais convoca as forças e atores populares de todos os países a desenvolver ações de mobilização, coordenadas em nível mundial, para contribuir com a emancipação e a autodeterminação de nossos povos, reforçando a luta contra o capitalismo.



Convocamos todos e todas a fortalecer o Encontro Internacional de Direitos Humanos em solidaridade com Honduras e a construir o Fórum Social Palestina Livre, reforçando o movimento global de boicote, desinvestimentos e sanções contra o Estado de Israel e sua política de apartheid contra o povo palestino.



Tomemos as ruas a partir do dia 5 de junho, numa grande jornada de mobilização global contra o capitalismo. Convocamos a impulsionar a Cúpula dos Povos por justiça social e ambiental, contra a mercantilização da vida e em defesa dos bens comuns frente à Rio+20.



Se o presente é de luta, o futuro é nosso!



Porto Alegre, 28 de janeiro de 2012

Assembleia dos Movimentos Sociais



(Com agências e Comunicação FPA)


Fonte: PT.org.br

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