Há um ano atrás a Marcha das Vadias foi  construída como uma resposta irreverente contra a responsabilização das mulheres  pelas violências sofridas e a estigmatização dos corpos femininos.  Potencializada pela mobilização nas redes sociais, a Marcha ganhou vários países  e, no Brasil, várias cidades. Algumas conseguiram dialogar com a conjuntura  local e denunciar práticas de machismo naturalizadas, como por exemplo, a  denúncia da prática machista de Rafinha Bastos na televisão e em sua casa de  show em São Paulo. 
Passado um ano dessa movimentação é preciso  refletir tanto sobre as formas como o capitalismo e o patriarcado mercantilizam  a vida e o corpo das mulheres, como os instrumentos de resistências aos quais  dispomos. Essa segunda tarefa passa por perceber que, muitas vezes, a violência  contra as mulheres precisa de uma resposta rápida e incisiva, como se deu com a  Marcha das Vadias, mas que seu enfrentamento deve ser um processo cotidiano, que  vai além de um evento. 
Desde o final dos anos 70, o conjunto do  movimento de mulheres, através da insígnia “nosso corpo nos pertence”, buscou  questionar as imposições do patriarcado sobre a autonomia das mulheres – questão  de fundo da Marcha das Vadias. Essa bandeira tem significado a luta das mulheres  pelo direito de viver a sua sexualidade livremente, a luta por autonomia sobre o  corpo e a vida, desde o exercício autônomo do desejo e do direito ao prazer, à  legalização do aborto.
Retomamos esta luta, aprofundando a  compreensão da sua dimensão anti-capitalista, uma vez que denunciamos como a  sociedade de mercado impõe padrões de beleza racistas e sexistas e como o  mercado difunde uma ideia do corpo das mulheres como objeto - em constante  ajuste, retoque, conserto.  As indústrias farmacêuticas e cosméticas acumulam  lucros estrondosos, à custa da propagação da insegurança das mulheres, gerando,  além de tudo, graves doenças como os distúrbios alimentares. 
A associação entre capitalismo e patriarcado,  que transforma as mulheres em objetos, está no centro da violência sexista. O  Brasil possui o sétimo maior índice de homicídios de mulheres do mundo. Essas  mulheres são assassinadas, muitas vezes, porque não se calaram diante de  situações de violência ou porque exerceram sua autonomia. Conforme aponta  pesquisa da Fundação Perseu Abramo (2010), a cada dois minutos 5 mulheres são  espancadas no país, a cada minuto 5 mulheres sofrem assédio sexual, e a cada  hora 220 mulheres são obrigadas a ter relações sexuais forçadas. 
Essa situação de extrema objetificação da  mulher está expressa no indignante caso de violência machista e sexista ocorrido  no município de Queimadas no estado da Paraíba. Um estupro coletivo de cinco  mulheres, sendo duas delas, assassinadas brutalmente por dez homens durante uma  festa realizada por eles com o intuito de “presentear” o aniversariante com o  estupro dessas mulheres. Este foi um ato de extremo machismo e misoginia pelo  nível de crueldade, violência e desprezo pela vida das mulheres, derivados de um  clima de terror que gera a perseguição e morte, caracterizados pelo abuso físico  e verbal, estupro, tortura, escravidão sexual, espancamentos.  Este crime  bárbaro precisa ser punido com todo rigor da lei!
Além disso, a prostituição continua sendo  vista por muitos como uma forma de viver a sexualidade. Para nós, ela representa  a mercantilização, violência e subjulgação as quais as mulheres são submetidas.  Sabemos que a indústria do sexo é um setor internacionalmente articulado, que  gera lucros enormes e é associado ao tráfico de drogas, armas, corrupção e  esquemas de crime organizado e sobrevive da exploração massiva do corpo de  mulheres e crianças.  Somos solidárias às mulheres que são vítimas dessa forma  de exploração da sociedade patriarcal, mas é preciso perceber que a prostituição  só existe em um sistema que se articula em torno da subordinação das mulheres e,  portanto, não produz nada relacionado à liberdade e autonomia, ao contrário, a  mulher se encontra escravizada por uma rede mercantilizada de controle do seu  corpo e da sua vida. Essas redes funcionam como organizações criminosas que  traficam e escravizam na sua maioria mulheres jovens negras entre 17 e 27 anos.  
Essas formas materiais e simbólicas que  constituem a opressão das mulheres na conjuntura atual revelam a necessidade de  formas de mobilização e instrumentos de resistência que ultrapassem os limites  da Marcha das Vadias. Essa resistência tem sido forjada há anos pelo conjunto  dos movimentos de mulheres, pela articulação de mulheres nos movimentos mistos e  pelas alianças entre movimentos que tem na sua base a luta por outro sistema.  Não é possível “resolver” a opressão das mulheres, nos auto-intitulando “todas  vadias”. Mas é preciso aprender com as novas formas de articulação,  potencializadas pelas tecnologias da informação e comunicação, atualizando  nossas formas de ação.
É preciso reafirmar a importância da  auto-organização e resistência das mulheres para construção de um mundo baseado  na igualdade, na solidariedade e livre de violência. É preciso fortalecer a  nossa luta cotidiana contra a mercantilização das mulheres.
Negamos a falsa liberdade, oferecida pelo  mercado, que se encerra unicamente na ideia de não ter impedimentos para a ação.  Esta idéia está na base da banalização da sexualidade, tornando-a mais um  produto a serviço dos lucros. Temos que ir além disso. É preciso construir a  liberdade como condição necessária para a igualdade e como condição da autonomia  tanto coletiva como individual das mulheres. Somente a partir desta compreensão  é que faz sentido seguir em marcha até que TODAS sejamos livres!
Assim, estamos em constante luta para que as  mulheres não sejam caracterizadas como vadias por sair dos padrões de  comportamento, nem como qualquer outro símbolo que as menospreze e as diminua.   Reafirmamos o direito de todas as mulheres viverem livre de estigmas,  estereótipos, violência e exploração!!! 
DOMINGO 27/05 - 9H  - CONCENTRAÇÃO NA ESCADINHA DA ESTAÇÃO DAS DOCAS
Marcha Mundial das  Mulheres
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