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quarta-feira, 27 de março de 2024

1964: O que aprendemos depois de 60 anos?

 




Vamos participar!

Professora tem artigo publicado na Edição 11ª do In Formação

 





SOME - ARTIGO


Professora tem artigo publicado na edição 11ª do In Formação


A professora Nayana Dias Pajeu, do Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME, foi uma das escolhidas, para ter seu artigo Jogos e Bricadeiras na Educação Inclusiva, publicado na 11ª edição, da revista IN FORMAÇÃO, do Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Pará, que objetiva publicizar pesquisas dos servidores e práticas que obtiveram sucesso nas escolas da rede pública.

Resumo - Em sua pesquisa, a professora Nayana Pajeú, ...enfatiza o valor das atividades lúdicas em sala de aula, entendendo os desafios que a educação atual, a qual deve garantir o acesso aos conteúdos básicos da escolarização para todos os alunos, especialmente aqueles que possuem necessidades educacionais especiais.

O objetivo é verificar a importância dos jogos e brincadeiras como metodologia da Educação Inclusiva. 

A metodologia utilizada foi uma pesquisa bibliográfica, realizada a partir de uma pesquisa virtual, com artigos disponíveis em sites de  conteúdos científicos. 

Nesse contexto, a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras (Lakatos, Marconi, 2010, p.166). É importante assinalar, nesse caso, que os jogos e brincadeiras são atividades que libertam e desenvolvem habilidades e, por conseguinte, favorecem a construção do pensamento reflexivo. _Nesse contexto, o docente deve estar ciente de que o lúdico não é a única opção para melhorar o ensino-aprendizagem, mas deve ser sempre visto como uma importante ferramenta que auxilia na melhora dos resultados por parte dos educadores preocupados em causar mudanças na educação atual.


Via:📰 Modular Notícias

sexta-feira, 8 de março de 2024

Dia Das Mulheres

 


Mulher

 

  Ribamar Oliveira

 

         I

 

Mulher,  sinceramente,  Mulher/

Mulher que luta e guerreira/

Quando entende o mundo/

Já não faz qualquer besteira.

 

              I I

 

Começa a se dedicar a aprender/

Quando aprende, faz para familiares e sociedade/

Ampliando seus horizontes/

Ninguém tem piedade.

 

            III

 

Quando casa, tem trabalho,  filhos e marido/

Caminha tudo junto/

Tem que arrumar casa,  passar ferro e ajeitar a família/

As vezes esquece dela em algum momento.


Dia das Mulheres

 



Mulher

 

  Ribamar Oliveira

 

             I

 

Tratar de mulher é tratar de empoderar/

Buscar reviver a luta feminina conquistada/

É entender os direitos adquiridos que são cerceados e negados/

É fortalecer uma sociedade não recatada.

 

          II

 

Falar de mulher hoje em seu dia/

É buscar fortalecer a independência feminina/

Tudo em processo de evolução/

Lutando pela melhor solução.

 

          III

 

Questionar políticas públicas para mulheres/

Faz parte de fazer lutar/

Todos juntos e juntas/

Para melhor comemorar.


Dia das Mulheres

 


História das Mulheres

 

      Ribamar Oliveira

 

          I

 

Esta história não são só delas/

Pertence  também a família,  a criança,  ao trabalho,  a mídia e a literatura/

É a história do seu corpo, sexualidade  e da violência/

Hoje é dia de refletir essa leitura.

 

            II

 

As imagens das mulheres são sublimes/

No século passado ganham visibilidades/

Sejam com livros e manifestos/

Todos e todas conhecem suas realidades.

 

           III

 

Abordar o cotidiano das mulheres e suas práticas femininas/

Umas seriam boas: mães e esposas/

Outras seriam odiadas e perseguidas: As feiticeiras, lésbicas, rebeldes, anarquistas, prostitutas e loucas/

Por isso conto essas prosas.


Às mulheres no Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME




Nesta data, oito de março, em que se comemora o Dia Internacional das Mulheres, nós professores do SOME, queremos também prestar nossas homenagens a vocês mulheres, muito embora saibamos que todos os dias são seus. Vocês dão um quê de especial ao SOME, se já não bastasse seus filhos, vocês educam além seus alunos, nós, homens que convivemos com vocês ao longo da jornada do SOME. A música do tremendão Erasmo Carlos fala um pouco por nós quando ele canta “mulher, mulher na escola em que você foi ensinada, jamais tirei um dez, sou forte mas não chego aos seus pés”... de fato, vocês são fortes, guerreiras, determinadas, sabem pra onde vão e o que querem.

 

Uma parte significativa de professores do SOME que são mulheres, portanto, são protagonizadas da educação no campo, e em especial no Sistema Modular de Ensino.

 

A importância de vocês no cotidiano é fundamental já que lutam pela autonomia, justiça, igualdade e liberdade, além de atuarem na sala de aula, seus ensinamentos vão além, não se limitam a ensinarem para que seus alunos sejam aprovados no ENEM, vocês educam para a vida.

 

Sabemos que a educação deve ser construída coletivamente, com a participação de diversos sujeitos que integram e estimulam emancipação dos sujeitos, e a participação de vocês, mulheres professoras, é de suma importância.

 

Sabemos o quanto é difícil pra vocês mulher, deixarem seus afazeres, casa, filhos e lutarem por uma educação melhor e é isso que as fazem belas, amigas, mães maravilhosas, companheiras, únicas, encantadoras, enfim, pessoas especiais.

 

Que o dia 8 de março reafirme o ideal de liberdade e igualdade de gênero no contexto das lutas femininas, pois vocês mulheres merecem todo nosso respeito e gratidão pela sua importância no contexto social. Parabéns mulheres, estamos firmes e fortes com vocês.

 

Viva o dia oito de março! Viva as mulheres do SOME!

 

A vocês uma singela homenagem dos colegas professores.

 

Valdivino Cunha (Sociologia) e Ribamar de Oliveira (História)


quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

TODO BRASILEIRO É CAFUSO, MULATO E MAMELUCO




                    *Carlos Prestes

 

 

        Quanto que aprendemos quando tomamos a decisão de pegar aquele livro que estava quase que escondido entre outros tantos livros na estante empoeirada de nossa casa. O livro estava lá, nem sei quanto tempo, sem nenhuma utilidade aparente. Muitos anos, com certeza. Mas, de repente, bate aquela curiosidade de saber o que há lá dentro. Tantas palavras escritas, tantas páginas enumeradas que guardam o pensamento de alguém que dedicou tempo, suor, pesquisa, leitura, horas e horas intermináveis para colocar os seus estudos, as suas ideias, descobertas e conclusões naquele livro e mostrar ao mundo a sua obra prima. Aí você vai e revira os livros na estante, vai remexendo um por um, até que seus olhos se detêm num deles. Você o olha por alguns instantes e decide pegá-lo. Toma-o nas mãos, observa sua capa e resolve lê-lo.

        - Taí, gostei desse livro! Parece ser interessante. A capa é bonita e o título chama a atenção: A formação do povo brasileiro. É bom a gente conhecer um pouco da nossa história. Saber das nossas origens, da nossa formação. Depois, quando alguém perguntar, a gente vai saber explicar.

        Um livro que conta a história de nossas origens, do processo étnico, da formação de nosso país. Um livro contado por quem conhece essa gente, essa terra: O norte, o sul, o centro-oeste, o sudeste, como um caminhoneiro que atravessa o país de cabo a rabo, e se confronta com culturas diferentes da sua. Viajando nessas leituras, uma coisa me chamou a atenção em relação à formação do homem brasileiro, dos meus pais, dos meus tios, dos meus avós. Um de pele escura, outro de pele morena, outro de pele clara, outro diziam que era pardo. Gente de tantas cores diferentes numa mesma família. Aí eu pensei:  num país formado por três raças específicas: o branco (português/europeu), o negro (escravo) e o índio (nativo), e de cuja mistura nasceu o curiboca ou mameluco (branco com índio), o cafuzo (negro com índio) e o mulato (branco com negro), parece um tanto estranho pessoas de cor branca quererem fazer do Brasil uma Europa de sangue puro. Ou mesmo, na verdade, uma nova Alemanha com pensamentos e ações que ressuscitem o nazismo numa terra estrangeira.

        - Nazismo? Mas eu pensei que isso era coisa lá do outro lado do mundo. Como foi que isso chegou aqui? Nadando ou por terra?

        - Sei lá! Só sei que esse negócio de querer imitar tudo que vem de fora, um dia só podia dar nisso.

        O que tem a ver nazismo com racismo? O nazismo é também conhecido como Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, e foi considerado por historiadores como um movimento de extrema-direita. Esta ideologia foi responsável pelo extermínio de seis milhões de judeus, talvez até mais; seis milhões de seres humanos que tiveram suas vidas entregues nas mãos de homens, cujas mentalidades ensandecidas, vão além da compreensão humana. Mas não parou só nos judeus, pois outras minorias também foram perseguidas, como os ciganos, homossexuais e negros que, depois de presos, foram parar nos campos de concentração, onde, provavelmente, só coisas ruins os esperavam. Na mentalidade nazista, eram pessoas que não mereciam respirar o oxigênio dado ao ser humano de graça; pessoas imperfeitas, com sangue contaminado por um DNA inferior ao deles.

        - Vixi! Se essa moda pega aqui no Brasil...

        - Mas tem gente querendo que pegue. Não é a maioria, não. Mas é gente perigosa, que não gosta de paz, gosta de violência.

        Quem deu autoridade a um indivíduo de pele branca para achar-se superior a outro de pele diferente? Quem disse que a cor da pele concede a alguém o prêmio de estar no topo do mundo? Quem concedeu o direito a alguém de tirar a vida de uma pessoa negra, homossexual, judeu ou outro ser humano qualquer? A ideologia extremista com certeza tem pendido para o lado da loucura mental, porque esse tipo de ideologia em que pessoas se apegam tem se tornado um inimigo feroz da consciência, do livre pensar, pois está carregada de sentimentos baixos, como o orgulho, a vaidade, o individualismo, a arrogância, a soberba, a hipocrisia, o perfeccionismo.

        E a história dessas pessoas que padeceram e outras que ainda padecem nas mãos de gente insana? Onde elas estão agora? O que fazem? Parece que as suas histórias feitas de momentos felizes pararam em algum engarrafamento, numa rodovia de grande movimento, e, de repente, foram obrigadas a pegar um atalho, passando por tiriricas e flores com espinhos, sangrando os pés, as mãos, a dor forçando a lágrima a se desprender dos olhos. Não era essa a história para ser contada dessa gente, considerada por muitos, como sendo a minoria dentro de uma população. Tá, e se fosse? Os direitos não são iguais perante Deus e os homens, segundo a Carta Magna? Ora, rasgamos agora a Constituição Federal para retornarmos a uma monarquia absolutista? Ou quem sabe à “inquisição” da Idade Média? Já não basta tantas mortes de inocentes no passado? Ainda não aprendemos com tantos erros gritantes que as escritas da história, ao abrir suas páginas envelhecidas, tem nos mostrado? Não! Parece que ainda não aprendemos nada, ou quase nada.

        - E o povo lá quer saber de aprender história? Essa juventude quer saber é mais de jogos de game, de curtir música estrangeira. Lê dá trabalho, não dá? Cansa a mente. Se perguntar o que é racismo, discriminação ou preconceito, aposto que não vão saber dizer.

       Racismo é o termo que denomina discriminação e preconceito, que pode acontecer de forma direta ou indireta, contra uma pessoa, indivíduo ou grupos de pessoas de outra etnia ou cor. O preconceito é um juízo formulado sem qualquer conhecimento prévio do assunto tratado; já discriminar alguém é separá-la, excluí-la ou diferenciá-la do resto da sociedade ou grupo. Que desculpa arranjaremos agora, para dizermos que não sabíamos que tal coisa é racismo? Não temos desculpa. Vivemos na era da tecnologia, da informação por milésimos de segundos, estamos conectados com o mundo inteiro através das redes sociais, estamos longe e perto ao mesmo tempo. Quer verificar uma informação? Acesse o google. Quer se comunicar com grupos de amigos? Entre no whatsapp. Quer postar informações ou acessar informações, ou se conectar com amigos, ou conhecer novos amigos? Entre no facebook, acesso o youtuber, o twiter, o Instagram, o blog, etc., etc., etc. Então, porque ainda muita gente se comporta como se vivesse na Idade Média, sob os rigores de uma ditadura clerical, sem informação, sem conhecimento, sem acesso à leitura, como se estivesse proibido de adquirir cultura? Como se a cultura fosse algo pervertido, dissociado dos “bons” costumes sociais.

        Certo é que muitos imigrantes vieram para o Brasil em busca de melhores oportunidades. Boa parte desses imigrantes europeus se fixaram na região sul do Brasil e outros se espalharam pelo sudeste, e, também, pelo norte e nordeste. Depois deles, surgiram os seus descendentes nascidos em solo brasileiro, portanto, brasileiros natos. Alguns costumes e hábitos foram preservados, passados de pai para filho, de uma geração a outra. E, assim, o choque cultural foi inevitável, pois havia uma forte cultura deixada pelos nativos da terra, que encontrou colo nos costumes trazidos pelos negros escravos africanos, quer fosse nas danças, nas cerimônias, nas histórias memorizadas, nos cantos, quer fosse na culinária, no modo de se vestir, na fala, nos artesanatos, numa tentativa de preservação de sua memória. Essas culturas foram se mesclando aos hábitos e costumes, e crendices trazidas pelo homem branco e dominador.

        - É, a mistura cultural chegou aqui e ficou. Aqui tem música pra todos os gostos. Tem carimbó, tem baião, lendas do norte, lendas do sul, comidas típicas de cada região, uma mesma língua com sotaques diferentes, crendices, festas...

        Mas parece que muitos não sabem disso, não conhecem a história real do Brasil, contada por pessoas reais, descendentes de quilombolas, de linhagens de povos Tupis, Guaranis, Tupinambás, etc.; histórias que têm suas origens antes mesmo do Brasil ser chamado de Brasil; histórias de pessoas que foram forçadas a deixar sua pátria e vir para cá, não na condição de turistas, ou de trabalhadores com promessa de emprego com carteira assinada, moradia, alimentação e vale transporte. Não, nada disso. São pessoas que foram arrancadas de suas famílias, de suas raízes, de sua terra, de sua gente, e os seus sonhos também foram arrancados, sem chance de se repetir. Que o diga Castro Alves, um poeta negro do século XIX, uma testemunha viva do tráfico negreiro em terras brasileiras. Foi sim, um ativo defensor da liberdade, da abolição da escravatura no país do samba e do amor. Não foi à toa que escreveu o seu famoso poema Navio Negreiro, todo inspirado na figura heroica do guerreiro africano que, sob o poderio armamentista e ganância incontida do homem civilizado, tombou no meio da batalha, sendo levado como troféu vivo, arrastado pelos grilhões que lhe prendiam os punhos e os pés, e iam deixando suas marcas na areia do chão das terras africanas que iam ficando pra trás, no assoalho dos porões do navio, no corpo cicatrizado, entregue ao cansaço, agora, na condição de um pobre miserável que não era dono mais de si, mas, apenas, mais um produto a ser comercializado. Deixo aqui um pedaço dessa memória: “Senhor, Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus, Se é deliro... ou se é verdade, Tanto horror perante os céus?!... Ó mar, por que não apagas Co'a esponja de tuas vagas, Do teu manto este borrão? Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufão! ...”

        - Gente sendo tratada como bicho. Oh! Mas nem os bichos deveriam ser tratados assim, de forma tão cruel, que não consigo encontrar nem adjetivos.

        Deus criou todos os seres vivos pelo sopro da sua boca, pela palavra, Deus falou e tudo se fez, e tudo passou a existir, mas, o homem, Deus fez com as suas próprias mãos, de forma diferenciada, e deu a ele inteligência e domínio sobre todos os animais, mas não sobre o próprio homem. E, naquele momento, não havia distinção de cor. Como essas distinções foram aparecendo? De onde surgiram as palavras Preconceito, racismo, discriminação? A escravidão de negros africanos acabou, foi abolida, mas parece que muita gente ainda não entendeu isso. Acham que vivem no tempo de sinhozinhos, de sinhás, de capitães do mato. E, no entanto, estamos no século XXI, num tempo em que assistimos a guerras reais entre países pela televisão, celular, computador.

        Porém, os noticiários estão repletos de casos de racismo, e de forma claramente exposta. Quantas pessoas atingidas que tiveram suas vidas, seu sossego, sua privacidade invadida? E os algozes pouco se importam com tamanho, idade, posição social, não, eles gostam é de machucar, sentem prazer na tristeza do outro. E quando são pegos em flagrante delito, ou são descobertos, arranjam as desculpas mais descabidas, numa tentativa de minimizar seu crime e escapar da punição: “Eu não sou racista. Falei por brincadeira.”, “Não foi bem isso que eu falei”, “Os pais do meu namorado são de cor escura também”, “Desculpa, foi sem querer.”

        - E quem recebeu a ofensa? Também sentiu por brincadeira ou ficou arrasado?

        Todas as dores são doloridas, seja num adulto ou numa criança, não importa. Quando alguém te barra a entrada numa loja, dizendo, disfarçadamente, que ali não tem o que você procura, sem ao menos perguntar o que você quer, e você vê pessoas de cor branca, bem aparentadas, entrando na loja sem serem molestadas, o que passa na sua cabeça? Você olha pro seu braço, olha pra sua pele, a sua pele é negra, a sua cor é negra. Aí você pensa: “Será que é por causa da minha cor?” De repente, cai a ficha: “Tá havendo preconceito aqui! Eu tô sendo discriminado!” Mas você nunca havia passado por isso. Não quer acreditar que isso está acontecendo com você. Sempre soube de notícias sobre racismo no Brasil, mas nunca pensou que um dia você seria a notícia.

        O que fazer? Você fica totalmente desarmado, olhando para aquela pessoa a sua frente, imaginando que o vê como um ser inferior, um pouco menos que meio cidadão, como era na terra de Ghandi quando a Inglaterra colonizou a Índia, em que indianos não podiam andar na mesma calçada que um cidadão inglês.

        - Quer dizer que o inglês era o intruso, e ainda mandava na casa do outro? Nunca aceitei essa ideia de colonização. Quem pediu pra ser colonizado? Quem pediu pra ser civilizado?

        E o mais triste de tudo isso, é que esses noticiários estão se tornando comuns, algo corriqueiro. Outra vez, enquanto os pais brancos de um menino negro adotado entravam em uma concessionária de carros caros para ver os modelos, o filho entrou em uma sala de espera onde havia alguns brinquedos e, ali, ficou, por algum tempo, se distraindo. Passados alguns minutos, o menino, cansado dos brinquedos, saiu da sala para procurar os pais. Ao vê-los, o menino foi em direção dos dois, mas, ao aproximar-se, o vendedor olhou-o e, não sabendo que era filho do casal, mandou que o menino saísse da loja imediatamente, dizendo que ali não era lugar pra gente da cor dele.

        - Sai daqui menino! Aqui não é lugar pra gente da tua cor!

        Os pais, naturalmente, ficaram indignados com a atitude do vendedor, e foram para as redes sociais denunciar aquele crime de racismo.

- Oi pessoal! Vocês nem imaginam o que aconteceu hoje com nosso filho, quando fomos a uma concessionária de veículos, pois pretendíamos comprar um carro. Nosso filho sofreu preconceito por causa da cor. Foi assim...

        A loja, como sempre, tentou se esquivar da culpa, enviando um comunicado à imprensa, dizendo que não comunga com atos de discriminação ou preconceito racial praticados por seus funcionários; disse também que zela pelo bom atendimento de todos os seus clientes, independente de cor, ou classe social.

        - Nós, da concessionária White Comunicamos à imprensa e a todos os nossos clientes que...

        De quem é a culpa, afinal? Do atendente? Do gerente? Da empresa? Por trás de toda empresa, que é construída de cimentos e tijolos, e ferros, existem pessoas de carne e osso que mandam e ditam as regras aos seus funcionários. Se o preconceito já vem de cima para baixo, como pará-lo? Como não se contaminar com seus tentáculos asquerosos que só fazem tornar uma pessoa hipócrita, pequena?

        Como será escrita a história da vida de uma pessoa, daqui para a frente, que sofreu preconceito racial? Que foi exposta na mídia? Que sofreu danos psicológicos que podem desencadear uma baixa autoestima, medo, sentimento de inferioridade, de rejeição? Somos seres humanos, sentimos, nos emocionamos, e a mente é uma incrível máquina que memoriza tudo, ou quase tudo, e deixa lá, naquele cantinho, guardado a sete chaves.

        - Você tá legal?

        - Tô!

        - Mas parece que não tá. Quer conversar um pouco?

        De vez em quando, essa caixinha da memória é aberta, e tudo o que estava agasalhado sai para fora, assim, de repente, como um vendaval, e vai bagunçando tudo pelo caminho. Aí, então, vem depressão, sentimento de inferioridade, tristeza, solidão, medo, insegurança. Sim, porque o ódio por outros seres humanos pode se transformar em tragédia, em violência física real e fatal.

        - E tudo isso por causa da pele?

        - Tudo isso porque pensam que são superiores, melhores do que nós. Porém, do que vale vestir uma roupa cara e ser pobre por dentro?

        Mas a voz não deve calar. Ela precisa gritar e continuar gritando para chamar a atenção da mídia, da população, do mundo, porque “vidas negras importam”. Lá fora, há muitos rostos ocultos, rostos que passaram pela triste experiencia da rejeição por causa da pele. Esses rostos precisam ser encorajados a se mostrarem, a denunciarem o preconceito que sofreram e que sofrem. Não é necessário que alguém morra para virar mártir, como aconteceu lá nos Estados Unidos. Não podemos esperar que uma vida se perca para sairmos às ruas e soltar a voz juntos, em multidão, porque todo brasileiro é miscigenado, tem um pouco do índio, do negro, do branco, tem sotaques diversos, hábitos culturais diversos, que se diferenciam de uma região para outra região do país.

        - Dizem que sou pardo, na minha certidão tá assim. Na verdade, em algumas instituições já passei por pessoa de cor escura ou morena. Mas na minha receita médica escreveram “cor branca”. O quê que tá acontecendo com o mundo? Querem mudar a minha cor com uma canetada?

        Esquecemos que o maior jogador de futebol de todos os tempos, o rei Pelé, é negro? Que Pixinguinha, Cartola, Martinho da Vila, Paulinho da Viola e tantos outros nomes imortais da música popular brasileira são negros? Que no carnaval – que junta todas as raças – predomina a cor negra? O famoso pastor americano Martin Luter king era negro. A lista parece não ter fim, pois temos Muhammad Ali, um dos maiores lutadores de boxe peso pesado de todos os tempos; Nelson Mandela, que foi presidente da África do Sul, e, também, considerado o mais importante líder da África negra; Harriet Tubman (1822 - 1913), uma jovem negra e toda sua família viviam em condições de escravidão numa fazenda, no leste dos Estados Unidos, fugiu e conseguiu libertar muitos outros. Durante a Guerra Civil Americana (1861 - 1865), serviu como voluntária, foi espiã, e liderou 150 soldados das tropas do norte contra os soldados do sul. Conseguiu a libertação de mais de 700 escravos dos Confederados. Tornou-se um símbolo americano de liberdade e coragem e seu rosto passaria a estampar a nota de vinte dólares no ano de 2020; Maria Firmina dos Reis (1825-1917), uma mulata, filha de pai negro e mãe branca, considerada a primeira romancista brasileira, publicou o romance Ursula, de cunho antiescravista; Sueli Carneiro (1950), uma das mulheres negras mais importantes da atualidade no Brasil, doutora em filosofia, criou o Instituto da Mulher Negra, um dos principais órgãos independentes da consciência racial no Brasil. É hoje uma referência do movimento negro nacional; Machado de Assis (1839-1908), um dos nomes brasileiros mais conhecidos no exterior, traduzido para inúmeras línguas, é considerado até hoje um dos maiores escritores do Brasil.

        - Quantas figuras ilustres nós temos no Brasil. Pena que muito brasileiro não saiba disso. É por isso que é bom ler bastante, mesmo. Quem lê, viaja, sai da frente da televisão, da monotonia da casa, do bairro, da cidade e vai correr os países, o mundo, o universo, o passado, o futuro...

        Quantos nomes deixaram de constar nesta lista. Os nomes são importantes, mas as pessoas são mais importantes que seus nomes. Pessoas são gente, vidas que passaram por esse chão e deixaram suas pegadas sem pensar que deixariam um legado pra negro ou pra branco. Simplesmente foram escrevendo suas biografias com seus sonhos, com seus calos, com suas lágrimas, com seus sabores e dissabores, com seus talentos. E deixaram. Deixaram um legado pra nossa geração e para a que há de vir.

        - Isso é importante. É muito importante. Tenho que recuperar o tempo perdido. Quero saber mais da formação do povo brasileiro. Quero conhecer as músicas, as danças, o folclore, as crenças...

        - Quem sabe assim a gente aprende a dar valor no que é nosso. A gente tem que defender a nossa história passada.

        Por isso, fico perplexo quando acesso o google pelo celular e vejo casos e casos de racismo sendo noticiado. Ponho-me aqui no lugar do outro, da vítima, e sinto como se minha identidade estivesse sendo pisoteada, e manchada, e rasgada em mil pedaços. Eu também quero existir, preciso existir, mas existir sendo eu mesmo, com minha própria pele, meu jeito de me vestir, de sorrir, meu belo cabelo em estilo Black Power ou não. Quero ter o direito de sair por aí e viver a minha liberdade de entrar no cinema sem ser barrado, pagar minha passagem e o cobrador não olhar pra mim desconfiado, passear no shopping, entrar nas lojas sem ser confundido com ladrão. Quero, quero muito sair por aí e não ter que ter sempre por perto alguém pra me defender, como se fosse um guarda-costas.

        - Isso aqui tá falando de mim. Eu já passei por esse tipo de constrangimento no ônibus. O cobrador pensou que eu fosse vendedor de bombom e mandou eu descer: “desce do ônibus, que é proibido vender bombom aqui!”

        Eu moro no país das diversidades, das cores múltiplas, do Samba, do Sertanejo, do Axé, do Funk, da Bossa Nova, do Rap, da MPB, do Brega, da Tropicália, da Jovem Guarda, do Batidão, da Sofrência. Todos esses estilos musicais têm entrada em todas as classes sociais. Lá, está também o estilo que me representa, que é a minha cor, o meu sangue, a minha etnia, que anima e faz todo mundo cantar e dançar. Então, por que eu tenho que ficar de fora do baile? Por que não posso entrar também? Cadê o meu rosto? O meu rosto são tantos e é um só, porque a dor é uma só em todos.

        Eu não quero mais viver na fantasia do carnaval, apenas aqueles dias de glória, com uma máscara cobrindo meu rosto, lavado de suor, pra depois, na quarta-feira de cinzas, depois que o Zepellin bater asas e voar, o prefeito, o juiz, o bispo, o banqueiro se voltarem contra mim, e incitarem o povo a jogar pedras na Geni.

        - Geni! Essa comparação foi forte.

        Eu não sou a Geni. Tenho identidade própria. Eu sou eu, um cidadão brasileiro, negro, estudante e trabalhador, da periferia ou do cento, de pais pobres ou da classe média baixa ou alta, tenho cabelos black power, liso, encaracolados ou trançados, tenho amigos que não se importam com minha cor, gosto de música que enalteça a vida, gosto de cantar e dançar como se estivesse cantando na chuva. Sou sim, um cidadão comum, como outro qualquer, que quer apenas estar de bem com a vida, que respeita e quer ser respeitado. Sou João, Antônio, José, Benedito, Raimundo. Tenho um nome muito comum, mas não se engane o leitor...  Eu não aceito mais calado qualquer tipo de preconceito contra mim. Por quê? Porque, assim como qualquer vida importa (a do branco, do cafuso, do mulato e do mameluco), vidas negras também importam.

        - É isso aí! Falou tudo! Vidas negras importam e ponto final!

 

Carlos Prestes - Curitiba (PR), 09 de maio de 2022.


*O professor Carlos Prestes é poeta e escritor.