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sexta-feira, 15 de outubro de 2021

DIA DOS PROFESSORES NO BRASIL

 


O Editor do Blog do Riba, que também é Professor por mais de 30 anos, escolheu três textos, considerados melhores e de próprio punho, publicados nas redes sociais durante a data de hoje, pedindo autorização para os autores, quando comemora-se o Dia dos Professores e parabenizo os professores selecionados, que são os seguintes:


Nas alegrias desse momento festivo, percebemos que nossas emoções evidenciam a dimensão dos lastros de amizade formados no universo da docência em territórios paraenses, através do Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME). Juntos percebemos que ensinar vai muito além de transmitir conhecimento; se não envolver inúmeras provocações que desafiem a inércia dos sujeitos que transformam a sociedade, perde em grande parte seu sentido. Juntos amadurecemos diante dos gritantes desafios de fazer da Educação, uma ação consequente na imensa territorialidade da Amazônia paraense, especialmente com os povos dos campos, das ilhas, quilombolas, etnias  diversas... nos fizemos fortes, mesmo no cansaço dessa estrada, politicamente enlamaçada. As dificuldades desse processo fizeram nascer em nós um misto de valentia e docilidade, de fúria e generosidade... de um monte de coisas antagônicas e necessárias. Me arrisco a dizer que dos 15 anos como docente no SOME e outros 16 anos nas escolas de Belém, nunca vi e vivi elo tão forte e tão alentador para as lutas que travamos, contra a tirania de sucessivos governos que representam frentes de impedimentos para o avanço social do proletariado através da  Educação. Juntos aprendemos a parear o exercício da docência com nossos estudantes, sem se ausentar dos movimentos reivindicatórios de rua por educação de qualidade, dignidade salarial e justiça. Nos nossos distanciamentos espaciais e temporais, é nas ruas que nos últimos 19 anos, temos nos encontrado e de lá, saem nossas sugestões para esses reencontros de alegria e fortalecimento.


Aproveito esses registros para parabenizar meus amigos professores, minhas amigas professoras, todos e todas que trabalham com educação, em qualquer lugar, inspirados/as nos sentimentos de "Educação: compromisso, responsabilidade e luta"; pra vocês, tenho todo prazer em dizer: FELIZ DIA DOS PROFESSORES E DAS PROFESSORAS. Estou feliz pq vcs são muitos e muitas 🎓🎓💐😘😘


Profa. Marina de Sousa Costa, Mestra em Educação, Universidade de Évora/Portugal. Graduação em Biologia(UFPA) e Educação Física(UEPA). Professora por 15 anos(1988-2003) pelo Sistema de Organização Modular de Ensino- SOME e atualmente é docente no Centro de Educação de Jovens e Adultos(CEEJA).






Sempre que me pego pensando sobre como a vida me trouxe a condição de Professor, se fecho os olhos, a primeira imagem que me vem é a de minha primeira professora. Tia Dadá, como era conhecida, morava em uma pequena casa de madeira na passagem Alvino, rua de chão batido no bairro do Guamá, periferia de Belém.  Na casa de dois compartimentos, a sala improvisada, quadro velho de giz dependurado na parede, espaço usado para receber os meninos e meninas da área que sonhavam em aprender as primeiras palavras.  Corpo franzino, envelhecido, curvado, braços longos, nas mãos os sinais do tempo, passos lentos, cabelos escorridos, fala compassada, olhar sonhador apesar da falta de tudo. Suas mãos firmes guiavam os nossos, primeiros traços, segura o lápis, apaga, faz  e refaz, dedicação, paciência, resiliência.  Entre um tracejo e outro, um grito externo, estridente: DONA DADÁ, CARVÃO... As palavras rabiscadas no quadro eram copiadas com diferentes graus de dificuldade, enquanto isso, na parte dos fundos da casa, as mãos habilidosas mediam o carvão em uma lata batida. Lá se vai o comprador correndo, um moleque qualquer fedendo de sol, ficava o cheiro de poeira escura, tijuco seco e vinha a angústia de que a professora esquecesse de lavar as mãos e tocasse o caderno. Sua proximidade era um misto de receio pelo erro e respeito absoluto. A tarde avançava rapidamente nas cadeiras germinadas, calor, os netos passando pra lá e pra cá. Interrupções contínuas pelos chamados e então a maior lição: partilhar. Chegava a hora do lanche, sabedora de que muitas merendeiras vinham vazias de casa, por sinal para alguns este era um item de luxo, já era muito poder trazer o caderno confeccionado com papel de pão reaproveitado da taberna do Seu Zé, ou do comércio do crente, objeto cuidadosamente arrumado no saco de compras, lavado para este fim. Atenta a situação desigual, Tia Dadá, como sempre fazia pedia para que todos os que dispunham dividissem, compartilhassem a merenda, como se dividia também o lápis, o caderno e o apontador. Daqui a pouco era hora de correr de volta pra casa e sempre que possível fugir para o futebol, praticado sobre a casca de castanha recém aterrada. Os anos se passaram, fui para o Internato São Benedito, Escola Sílvio Nascimento, Monsenhor Azevedo, Edgar Pinheiro Porto e mais tarde, cabeça pelada, pitiu de ovo cheguei a UFPA.  Em todos estes lugares muitos professores me inspiraram. Ainda hoje, guardo a imensa vontade de abraçar a Tia Dadá e poder lhe dizer que honrei todo o seu esforço, como o de outros tantos professores que a vida colocou em meu caminho e que me presentearam com seus ensinamentos.  Se pudesse agora abraçaria a todos eles e gritaria que com muita luta e orgulho me tornei PROFESSOR, e que venho ajudando a semear sonhos, ajudando a construir um mundo melhor.  Com a lembrança de Dona Dadá quero homenagear a todos os mestres deste país tão desigual, mas que labutam firmemente em defesa de um mundo melhor, em particular, aos amigos professores que a trincheira educacional me proporcionou. Seguimos na trincheira.


Prof. Agnaldo Rabelo, Graduado em Geografia,  Especialista em Estudos de Cultura Amazônica,  Mestrado e Doutorado em Ciências Sociais com ênfase em Antropologia pela UFPA.














Um dia aluno, hoje professor

Confessor que não era meu sonho de criança professor. O que eu queria mesmo era ser jogador de futebol, passar no concurso do Banco do Brasil ou ainda tornar-me médico. Nada disso se concretizou e eu tornei-me professor de sociologia.

Já faz um bom tempo em que fui aluno do fundamental, que naquele tempo se chamava primário, portanto, você tem o direito de achar algo estranho ou mesmo de sorrir se não entender o que estou falando, afinal já vivi um pouco.

No meu tempo (esse termo é típico de idoso), professor era professor e aluno era aluno e ponto final. Ser professor era ser autoridade. Meu professor primário era quem me ensinava matemática, português, biologia, historia, geografia... e por aí vai. Além das notas por disciplinas, eu tinha também uma nota por comportamento. Não havia cadeiras , eram carteiras que  eram ocupadas dois alunos, entrava um de cada vez. Elas eram feitas em madeira, já com bancos presos a ela que além da parte superior, para leitura e escrita, havia também uma parte inferior na forma de caixote onde guardávamos livros e cadernos. Não tinha cadeados, mas há de quem ousasse pegar alguma coisa do colega, ia direto pra secretaria e só sai de lá após a presença de um pai ou responsável, mas isso era raro de acontecer.

No meu tempo, quando a professora, a diretora ou qualquer outra pessoa adentrava em nossa sala de aula, todos levantávamos e ficávamos de pé até que a pessoa( ou autoridade) sinalizasse que poderíamos sentar.

Vocês já ouviram falar da palmatória? O titio aqui já e fez uso dela, aliás, usaram-na em mim. Vou explicar que “ferramenta educacional” era essa: Ela era um instrumento que possuía um cabo de madeira e em sua ponta estava encaixada um pedaço arredondado do tamanho de uma tampa de margarina pequena com pequenos furinhos. O uso da palmatória  foi introduzido pelos jesuítas como forma de disciplinar os indígenas e que foi adaptada as escolas. Seu uso mais corriqueiro se dava em sabatina de tabuada. O aluno que não soubesse quanto era 9X7 de prontidão pegava umas bolachadas de palmatória. A dor era tamanha que na próxima sabatina ele já sabia toda a tabuada.

Sou do tempo em que não havia Conselho Tutelar. Uma vez a professora me fez ir ao quadro negro (em sua escola ainda existe essa ferramenta?) Pediu que eu escrevesse cinco palavras que iniciasse com a letra H. Fiquei pálido, branco, preto e nem uma palavra me veio a cabeça naquele momento interminável que iniciasse com aquela maldita letra H. Foi um branco total. Você sabe o que ela fez comigo? Passou a mão em minha cabeça e mandou eu estudar? Nam, nam, nam. Ela se aproximou de mim, escolheu uma de minha orelhas e começou a torcer como se torce uma chave na porta. Você acha que ficou só nisso? Nam, nam, nam. Ela resolveu ir me levar a minha carteira. Cada passo era uma torcida na orelha. Ela andava puxando minha orelha e ainda me dizia em forma silabada, pausada:
- Nunca diga que não sei e sim que hei de saber. 

Disse-me também que no dia seguinte ia me fazer a mesma pergunta. Naquele dia desejei que um carro a atropelasse sua bicicleta quando ela estivesse de volta a sua casa. Nunca mais esqueci que hoje, hino, heroína, hálito, houve, habito, habilidoso, humano, horário, hora,  higiene, que iniciam com a bem dita letra H. 

Acho que nasci no tempo errado. Quando era bom ser professor, eu era aluno e hoje como é bom ser aluno, sou professor. Hoje quando peço, imploro que os alunos usem máscara para se protegerem da covid 19 eles riem, fingem que botam e depois tiram. Lá fora, um deles  me ameaça em forma de  brincadeira:

- Olha professor, se o senhor me obrigar a usar a máscara, vou chamar o Conselho Tutelar!
Tenho vontade de agarrar sua orelhinha, torcer e torná-la um pouco maior, como fez comigo minha professora quando eu era estudante primário.

Ser professor é colocar-se a disposição de ensinar e aprender de vez em quando. 

Neste dia, quero mandar um grande abraços a todos os professores e àqueles que fizeram com que eu me tornasse professor.


Prof. Valdivino Cunha, Sociólogo e Professor do Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME.


2 comentários:

  1. Obrigado pela publicação do meu texto, assim temos mídias alternativas que são importantes espaços de informação fora dos grandes conglomerados mudiaticos

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  2. O Blog do Riba se dispõe a postar as produções dos trabalhadores e trabalhadoras em educação e suas experiências nas práticas pedagógicas, Professor Valdivino.

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