Por Cláudio Puty, publicado em O Liberal (20/05/2012) *
Publicado em O Liberal, 20/05/2012
Cláudio Puty (*)
O modelo neoliberal da oposição demo-tucana foi fragorosamente derrotado nas urnas nas últimas três eleições presidenciais e rejeitado como projeto de governo desde 2003. Mesmo assim, ainda há setores que continuam a entoar o mantra de que a grande virtude dos governos Lula e Dilma foi ter mantido a política econômica de FHC. Ora, as prioridades do país mudaram tão radicalmente nesta última década que só a miopia ideológica ou a má-fé política podem sustentar essa versão fantasiosa.
A ruptura com o receituário ortodoxo começou no governo Lula, quando o Estado deixou de ser “mínimo” e passou a atuar como indutor do crescimento. Adotaram-se políticas como a valorização do salário mínimo, a expansão do crédito, a ampliação dos programas sociais e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Paradoxalmente, a crise internacional que começou em 2008 ofereceu uma janela de oportunidade para o Brasil aprofundar suas políticas anticíclicas.
Uma mudança importante foi o resultado primário das contas públicas. O governo Lula retirou da contabilização do resultado primário a Petrobras e Eletrobrás, fato esse que permitiu a esses grupos a maior flexibilidade e eficiência na gestão das suas respectivas carteiras de projetos de investimentos. Isso favoreceu o investimento em infraestrutura e, consequentemente, o crescimento da economia.
Outro ponto fundamental foi a capitalização do BNDES, realizada pelo Tesouro Nacional a partir de 2009, na forma de aportes em títulos públicos. Ela equacionou as necessidades de fundings(constituição e alongamento do passivo do banco) necessários à expansão da oferta de crédito pelo banco e, consequentemente, à expansão dos investimentos de longo prazo na economia brasileira.
Sob a presidenta Dilma Rousseff, a opção desenvolvimentista se aprofundou. Estabeleceu-se um mecanismo de controle de capitais com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre aplicações financeiras de estrangeiros e extinguiu-se a cobertura cambial para exportadores. Depois, com o Plano Brasil Maior, o governo criou as bases de uma política industrial com vistas a reverter a queda da participação da indústria nacional no PIB e nas exportações. É bom lembrar que o ex-ministro Pedro Malan, “czar” da economia dos anos FHC, chegou a dizer que “a melhor política industrial é não ter política industrial”.
Quando o crescimento do consumo provocado pelas medidas de estímulo levou a um repique da inflação, no ano passado, o “mercado” tinha certeza que o governo voltaria a adotar o remédio clássico de aumento de juros, abandonando suas veleidades desenvolvimentistas. Mas Dilma surpreendeu e adotou as chamadas medidas “macroprudenciais”, que objetivavam moderar a expansão do crédito. Com isso, sem aumentar os juros, o governo conseguiu manter a inflação dentro da meta (6,5%) em 2011.
Em relação à política monetária, o Banco Central vem baixando os juros básicos – a taxa Selic – de maneira sustentável. Desde julho de 2011, ela caiu de 12,50% para 9%. Reforçando essa política, os bancos oficiais – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal – baixaram suas taxas de juros ao consumidor. Com isso, os bancos privados foram obrigados a reduzir o spread – a diferença entre os juros pagos por eles ao captarem recursos e o custo dos empréstimos feitos aos clientes – tanto para pessoas físicas quanto para empresas. Alguém imagina o governo FHC neste papel?
Depois disso, o governo deu mais um passo e mudou as regras da caderneta de poupança sem prejudicar poupadores e empresários. Além de manter boas perspectivas de lucros para o futuro, essa mudança estabeleceu as condições necessárias para que a taxa básica de juros possa continuar caindo, sem provocar grandes alterações na economia brasileira.
Outro exemplo de reorientação radical das políticas incensadas pelo Consenso de Washington foi a opção do Brasil de priorizar a opção sul-sul, que teve início nas discussões sobre subsídios agrícolas na Rodada Doha da Organização Mundial de Comércio e consolidou-se com a formação do Grupo dos 20 e dos Brics. Uma das consequências dessa diplomacia emergente foi o acordo do MERCOSUL que possibilitou as negociações para o uso da moeda local em transações comerciais bilaterais.
Por tudo isso, pode-se dizer que a diferença entre FHC e Lula/Dilma é a mesma existente entre um liberal e um socialista: o primeiro quer o “Estado mínimo”; o outro quer torná-lo agente do crescimento e da justiça social.
(*) Deputado federal (PT-PA)
O modelo neoliberal da oposição demo-tucana foi fragorosamente derrotado nas urnas nas últimas três eleições presidenciais e rejeitado como projeto de governo desde 2003. Mesmo assim, ainda há setores que continuam a entoar o mantra de que a grande virtude dos governos Lula e Dilma foi ter mantido a política econômica de FHC. Ora, as prioridades do país mudaram tão radicalmente nesta última década que só a miopia ideológica ou a má-fé política podem sustentar essa versão fantasiosa.
A ruptura com o receituário ortodoxo começou no governo Lula, quando o Estado deixou de ser “mínimo” e passou a atuar como indutor do crescimento. Adotaram-se políticas como a valorização do salário mínimo, a expansão do crédito, a ampliação dos programas sociais e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Paradoxalmente, a crise internacional que começou em 2008 ofereceu uma janela de oportunidade para o Brasil aprofundar suas políticas anticíclicas.
Uma mudança importante foi o resultado primário das contas públicas. O governo Lula retirou da contabilização do resultado primário a Petrobras e Eletrobrás, fato esse que permitiu a esses grupos a maior flexibilidade e eficiência na gestão das suas respectivas carteiras de projetos de investimentos. Isso favoreceu o investimento em infraestrutura e, consequentemente, o crescimento da economia.
Outro ponto fundamental foi a capitalização do BNDES, realizada pelo Tesouro Nacional a partir de 2009, na forma de aportes em títulos públicos. Ela equacionou as necessidades de fundings(constituição e alongamento do passivo do banco) necessários à expansão da oferta de crédito pelo banco e, consequentemente, à expansão dos investimentos de longo prazo na economia brasileira.
Sob a presidenta Dilma Rousseff, a opção desenvolvimentista se aprofundou. Estabeleceu-se um mecanismo de controle de capitais com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre aplicações financeiras de estrangeiros e extinguiu-se a cobertura cambial para exportadores. Depois, com o Plano Brasil Maior, o governo criou as bases de uma política industrial com vistas a reverter a queda da participação da indústria nacional no PIB e nas exportações. É bom lembrar que o ex-ministro Pedro Malan, “czar” da economia dos anos FHC, chegou a dizer que “a melhor política industrial é não ter política industrial”.
Quando o crescimento do consumo provocado pelas medidas de estímulo levou a um repique da inflação, no ano passado, o “mercado” tinha certeza que o governo voltaria a adotar o remédio clássico de aumento de juros, abandonando suas veleidades desenvolvimentistas. Mas Dilma surpreendeu e adotou as chamadas medidas “macroprudenciais”, que objetivavam moderar a expansão do crédito. Com isso, sem aumentar os juros, o governo conseguiu manter a inflação dentro da meta (6,5%) em 2011.
Em relação à política monetária, o Banco Central vem baixando os juros básicos – a taxa Selic – de maneira sustentável. Desde julho de 2011, ela caiu de 12,50% para 9%. Reforçando essa política, os bancos oficiais – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal – baixaram suas taxas de juros ao consumidor. Com isso, os bancos privados foram obrigados a reduzir o spread – a diferença entre os juros pagos por eles ao captarem recursos e o custo dos empréstimos feitos aos clientes – tanto para pessoas físicas quanto para empresas. Alguém imagina o governo FHC neste papel?
Depois disso, o governo deu mais um passo e mudou as regras da caderneta de poupança sem prejudicar poupadores e empresários. Além de manter boas perspectivas de lucros para o futuro, essa mudança estabeleceu as condições necessárias para que a taxa básica de juros possa continuar caindo, sem provocar grandes alterações na economia brasileira.
Outro exemplo de reorientação radical das políticas incensadas pelo Consenso de Washington foi a opção do Brasil de priorizar a opção sul-sul, que teve início nas discussões sobre subsídios agrícolas na Rodada Doha da Organização Mundial de Comércio e consolidou-se com a formação do Grupo dos 20 e dos Brics. Uma das consequências dessa diplomacia emergente foi o acordo do MERCOSUL que possibilitou as negociações para o uso da moeda local em transações comerciais bilaterais.
Por tudo isso, pode-se dizer que a diferença entre FHC e Lula/Dilma é a mesma existente entre um liberal e um socialista: o primeiro quer o “Estado mínimo”; o outro quer torná-lo agente do crescimento e da justiça social.
* Cláudio Puty é deputado federal (PT-PA) e membro da Coordenação Nacional da DS.
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