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quinta-feira, 4 de agosto de 2022

SALA DE AULA: UM PROJETO PEDAGÓGICO DE VIDA (Peça Teatral): Parte III

 


                                                          Carlos Alberto T. Prestes



CENA 3

 

Personagens:

Professor(a): Laura

Alunos(as): Cíntia, Cely e Deise

Na sala de aula, a professora Laura conversa com estudantes do 5º ano, turma A - 701 do ensino fundamental, sobre o relacionamento deles com o livro.

______________________________

PROFESSORA LAURA: 

Quem gosta de ler aqui?

ALUNOS: (levantam a mão e gritam em várias partes da sala).

Eu

PROFESSORA LAURA:

E por que vocês gostam de ler?

ALUNA CÍNTIA: 

Porque é legal. Faz a gente pensar que a gente tá num mundo imaginário.

ALUNA CELY:

Eu gosto de ler porque distrai.

PROFESSORA LAURA: 

E o que vocês gostam de ler?

ALUNOS: 

Gibi, histórias de super-heróis, contos de fada, lendas, historinhas de fantasmas, romances...

ALUNA CÍNTIA: 

Eu gosto de ler histórias de assombração, de gigantes, de mágicos, de bruxas, mas, principalmente, as histórias de contos de fadas. Minha mãe lia toda noite uma historinha pra eu dormir.

ALUNA CELY:

Eu adoro as revistas em quadrinhos, as histórias do tio Patinhas, do pato Donald, do Mickey, do Pateta, dos escoteiros mirins, histórias que falam da infância também.

ALUNA DEISE: 

Ninguém merece. Eu gosto de ler, mas estou sem motivação; pelo menos aqui, na escola, não sinto vontade.

PROFESSORA LAURA: 

E por que não, Deise?

ALUNA DEISE: 

Porque a gente só lê o que a professora Terezinha quer. O que a gente lê lá fora, não pode ler aqui. Tem que ser o que ela determina, o que está no plano de aula dela. E a professora ainda diz que a gente tem que ter cuidado com o livro, que não pode amassar, que não pode abrir demais pra não soltar as folhas.

PROFESSORA LAURA: 

Hum! ... É aí que está o seu problema, Deise?

ALUNA DEISE: 

Acho que sim! Tem livro que a gente não gosta de ler. Esses livros que a professora Terezinha manda a gente ler, só serve pra decorar e fazer prova. Só fala de conceito disso e conceito daquilo. Parece que não tem vida, igualzinho a ela.

PROFESSORA LAURA: 

Por que você está comparando um livro que você não gosta de ler com a professora Terezinha? O que tem a ver?

ALUNA DEISE: 

Um livro quando tem vida, ele bate as asas e voa, e faz a gente voar também junto com ele. A professora Terezinha já entra mal humorada na sala de aula, manda abrir o livro num determinado assunto e ler em silêncio. Depois, manda copiar do quadro algumas perguntas sobre o assunto lido e escrever as respostas no caderno. Não faz nem debate, não pede opinião. E quando alguém pergunta alguma coisa, ela diz que é pra ficar em silêncio, e que depois ela tira a dúvida de toda a turma.  

PROFESSORA LAURA: 

É, Deise, eu sei que tem professores que optam por uma didática diferente. Então, temos que acabar com certos preconceitos? Eu acho que devemos começar pelos nossos próprios “PRÉ-CONCEITOS” e procurar mostrar à professora, de maneira amigável, que existem outras formas de ministrar aulas. Vocês podem procura quebrar esse gelo e encontrar uma maneira de se aproximar da professora de vocês.

CÍNTIA: 

E como podemos fazer isso?

PROFESSORA LAURA: 

Vocês podem fazer a professora entender que vocês tem carinho por ela, apesar do modo como ela tem tratado vocês. Não sabemos dos seus problemas pessoais.

CELY: 

Sim, professora. Eu tive uma ideia. Vamos descobrir quando ela faz aniversário e fazemos uma surpresa pra ela.

PROFESSORA LAURA: 

Tão vendo como os problemas se tornam pequenos, quando as respostas são simples? Tenho certeza que vocês vão arrancar lágrimas da professora Terezinha.

DEISE: 

Agora, tô entendendo melhor, professora. Não basta apenas reclamar; tem que oferecer soluções também.

PROFESSORA LAURA: 

Isso mesmo, Deise. E quanto ao livro... Bem, temos que procurar descobrir o que ele quer nos comunicar, qual a mensagem. E aí quando você consegue se comunicar com o livro, quando consegue entender as palavras impressas naquelas páginas, aí ele vai ser o seu grande amigo; não importa se ele é brasileiro ou estrangeiro, se é curiboca ou europeu, se é técnico, científico, ou se é um romance de um escritor pouco letrado, ele será o seu grande amigo. Por isso, temos que ter coragem para transformar o livro, modifica-lo, adapta-lo às nossas necessidades. O livro tem que ser nosso amigo, e nós dele. Mas também temos que ter cuidado com ele, pois o livro é nosso amiguinho, não é? Ele nos faz viajar sem que tenhamos que pagar uma única passagem. Com ele, nós podemos conhecer o mundo todo, histórias do presente, do futuro, do passado. Eu nunca vou conseguir ler tudo o que eu gostaria de ler. E por quê? Porque são tantos, milhares, milhões de livros espalhados pelo planeta Terra. E pra todos os gostos. A vida e o pensamento das pessoas estão gravadas nas páginas dos livros... Pra sempre. Pelo menos, enquanto os livros existirem.

ALUNA DEISE: 

E como podemos ser amigos do livro?

PROFESSORA LAURA: 

É o seguinte: vamos fazer algumas atividades. Eu trouxe alguns livros que consegui com amigos e vizinhos, e alguns na biblioteca. Eles estão um pouco desgastados, mas é justamente isso o que eu queria. Livros desgastados. Vocês vão pegar nos livros, mexer nos livros. Se tem algum livro velho, vamos encapa-lo; se tem algum rasgado, vamos corta-lo, aproveitar as gravuras e construir outros livros. Vamos recria-los. Isso é importante porque vocês vão tocá-los, corta-los, cola-los, construí-los novamente.

PAUSA: A professora chama os alunos para junto da sua mesa e começam as atividades.

ALUNA CÍNTIA: 

Que legal! Eu estou construindo meu próprio livro.

PROFESSORA LAURA:

E qual é a história que você está construindo, Cíntia?

ALUNA CÍNTIA: 

É a história de uma menina que perdeu os pais num acidente de carro, quando eles estavam indo passar as férias em salinas. Ela tinha apenas seis anos de idade. O carro deslizou na areia que ficava na beira do asfalto, saiu da estrada e capotou várias vezes. Foi um milagre ela ter sobrevivido, mas os pais, infelizmente, não resistiram e morreram ali mesmo. Ela ficou dois meses hospitalizada. Quando saiu do hospital, foi morar com uma tia sua, a Leonice.

PROFESSORA LAURA:

E você já terminou toda a história do livro?

ALUNA CÍNTIA: 

Ainda não. Tô tentando imaginar como vai terminar essa história.

PROFESSORA LAURA: 

Bem, se a história é fruto da sua imaginação, pode ter o final que você quiser. Pode ser um fim triste pra essa menina, mas também pode ser alegre, feliz. Se a história for verdadeira... Bem, se a história for verdadeira, você ainda tem o poder de alterar o fim dela, colocando um pouco de ficção. Como você quer que a menina termine?

ALUNA CÍNTIA: 

A história é verdadeira. A menina existe. Ela se chama Daiana, o mesmo nome da princesa da Inglaterra. E ela é minha amiga. Mas, apesar da morte dos pais, ela, que tem hoje doze anos, é feliz morando com a tia dela. E é isso que eu vou colocar no meu livro. Um final feliz para a Daiana.

ALUNA DEISE:

Professora, onde vamos colocar os livros que estamos encapando, quando ficarem prontos?

PROFESSORA LAURA: 

Vamos montar um espaço de leitura pra exposição desses livros. E o aluno que quiser levar pra casa para ler, vai preencher uma ficha de cadastro pro nosso controle. O atendimento será sempre nos intervalos e os próprios alunos é que tomarão conta do espaço, preencherão as fichas de cadastro e emprestarão os livros.

ALUNA CELY: 

Como assim, professora? Todos nós juntos vamos tomar conta do espaço? Não é muita gente, não?

PROFESSORA LAURA: 

Não, Cely. Não é todo mundo junto não. Vamos fazer rodízio. Serão dois alunos por vez, pra tomar conta do espaço de leitura.

ALUNA CELY: 

Ah, sim! Agora entendi.

ALUNA DEISE: 

Professora, minha mãe é pedagoga e gosta de ler muito também. Acho que aprendi com ela o gosto pela leitura.

PROFESSORA LAURA: 

Que bom, Deise! Tenho certeza que ela trabalha com muita dedicação, pois, na nossa profissão, não basta apenas uma boa formação, conhecimento, leitura; tem que gostar, ser apaixonado pelo que faz, e isso se chama vocação, inclinação, dom, ou o que quiser chamar, mas tem que estar no sangue, tem que fluir pelas veias e envolver o ser como um todo.

ALUNA DEISE: 

Quando eu crescer, quero ser uma pedagoga também, como minha mãe.

PROFESSORA LAURA: 

Só isso já deve deixar a sua mãe realizada. Então, vamos, mãos à obra, porque tem um longo caminho até chegar lá, na universidade, dona Deise.

ALUNA CÍNTIA: 

Eu também quero ser pedagoga quando eu fizer faculdade. Mas não sei se vou trabalhar em sala de aula, não. Minha mãe me disse que tem um amigo, que é pedagogo e trabalha no Ministério Público daqui de Belém. Eu também quero trabalhar lá.

ALUNA CELY: 

Eu quero ser professora de literatura, porque eu gosto muito de ler.

PROFESSORA LAURA: 

Gente, alguém sabe do Patrick? Não vi ele na escola hoje.

DEISE: 

Ele não veio hoje, professora.

PROFESSORA LAURA: 

Não veio?  E por quê? Alguém sabe dizer?

ALUNA CÍNTIA: 

Não, professora. Ninguém sabe dizer ao certo. Mas o Rodrigo disse que parece que a polícia foi lá na casa dos tios do Patrick. O Rodrigo mora lá perto, mas ele não soube dizer se o Patrick foi preso. O Rodrigo não tava lá, na hora que a polícia chegou. Ele soube depois. Sabe como é subúrbio, né professora? Todo mundo comenta. Todo mundo vai pra rua querendo saber de tudo.

ALUNA DEISE: 

É verdade, professora. Todos nós moramos aqui no Guamá. O Patrick, às vezes, se mete com má companhia. A gente vê. O meu pai diz até pra eu não falar com ele, pra não fazer amizade, porque ele é bandido. Se o papai me pegar na rua conversando com o Patrick, ele me dá uma surra quando chegar em casa.

PROFESSORA LAURA: 

E você faz o quê? Evita falar com o Patrick?

ALUNA DEISE: 

Quando os meus pais estão por perto, eu evito, mas quando não tão, eu falo.

PROFESSORA LAURA: 

E por que ele não está morando com os pais, em Igarapé Miri?

ALUNA CÍNTIA: 

Parece que ele participou de vários assaltos lá. Inclusive, ele e mais dois chegaram a ferir um homem com duas facadas, que quase o homem morre. Foi internado aqui no Pronto Socorro de Belém, às pressas.

PROFESSORA LAURA: 

Meu Deus! E o que aconteceu com o Patrick e os outros dois? Eram todos menores de idade?

ALUNA CÍNTIA: 

Parece que só o Patrick era menor de idade. Os outros dois já tinham mais de dezoito anos e passagem pela polícia. Um conseguiu fugir, outro foi preso junto com o Patrick. Só que o Patrick, como é menor de idade, foi transferido pra um centro de recuperação de menor, enquanto que o outro, foi pra cadeia de adulto.

DEISE: 

É por isso que o Patrick veio pra Belém. Lá, ele tava sendo ameaçado de morte. Depois que foi solto, foi morar com os tios, porque parece que ele não pode voltar pra Igarapé Miri.

PROFESSORA LAURA: 

Vou pedir pra orientadora entrar em contato com os tios do Patrick. Quero saber dele. Se for preciso, vou até a casa deles.

PAUSA:

Toca a campainha, fim de aula. Todos vão para casa.

 

 

FIM FA TERCIRA CENA

 

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