*Valdivino Cunha da Silva
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Dias desses, um professor amigo meu me ligou, preocupado com o fato de estarmos em casa recebendo o salário no final do mês e não estarmos trabalhando. Expliquei-lhe que o fato de estarmos em casa e recebendo o salário no final do mês sem que estejamos de férias ou outro tipo de licença é uma situação jamais vista na história trabalhista mundial, portanto, não fomos nós, professores, que optamos pra ficar em casa. Estamos em casa por força de um decreto estadual com o objetivo poupar vidas, não apenas dos nossos alunos e de seus familiares, mas também, nossas. A vida vale mais que um ano letivo perdido. Assim sendo, não deve ser auto-imputado a nós, professores, qualquer sentimento de culpa. Portanto, o fato de não estarmos em sala de aula não nos faz preguiçosos ou inimigos da educação.
Não fiquemos nos sentido culpados também pelo fato de nós, professores do ensino básico da rede publica, não estarmos dando aulas através do ensino remoto. Não há como, pois muitos de nossos alunos não possuem se quer uma alimentação adequada, muito menos um tablet, celular, notebook ou internet. Não possui se quer um ambiente que uma atividade educacional remota requer, pois a maioria das casas de nossos alunos não possuem nem mesmo divisórias, é tudo junto e misturado. Não nos esqueçamos também de que ser professor não é um sacerdócio, por mais que gostemos da docência. O professor precisa ser visto como o principal pilar da estrutura educacional e um trabalhador que tem as mesmas necessidades e direitos de um operário, um engenheiro, médico ou de um carreteiro. Ficar em casa numa pandemia como essa, além de ser uma necessidade é um direito que deveria ser garantido a todos os trabalhadores e não apenas só a nós, professores, muito embora o nosso exercício profissional carregue particularidades.
Não nos deixemos contaminar pelo falso argumento de que o Estado não teria recursos financeiros para arcar com o pagamento de todos os trabalhadores. Isso é um grande engodo. Há recursos financeiros sim, basta ele fazer um deslocamento de recursos financeiros destinados a pagar a dívida aos grandes especuladores para pagar salários dos trabalhadores. Segundo os economistas sérios, há no caixa do Governo Federal mais de um trilhão, isso mesmo, mais de um trilhão de reais em reservas que se acumulam desde o governo do FHC, só que esses recursos o Governo destina ao pagamento da Dívida da União aos grandes investidores especulativos, daí ele não mexer nesse dinheiro que é do povo, da União, do trabalhador brasileiro. Dinheiro existe, o que não existe é compromisso com a população.
O Governo Federal dizia que o Brasil quebraria se a União fosse pagar o famigerado seiscentos reais aprovado pelo Congresso, pois o desgoverno do Bozo só queria liberar duzentos reais. Tudo era mentira. O que se viu foi que mais de dois milhões de “brasileiros invisíveis” saíram da linha da extrema pobreza, mesmo o governo deixando de fora centenas de brasileiros que embora tendo direito, não tiveram acesso aos seiscentos reais, uma crueldade sem tamanho.
Não imputem sobre nossos ombros o ônus do vírus. A (i) responsabilidade é toda do Governo que priorizou o empresariado em detrimento do trabalhador. Trocou o lockdown pela liberação do comercio, viu a pandemia como uma gripezinha. Está morrendo gente como morre gado no abatedouro. Essa missão por parte do Governo já ceifou-se mais de cem mil vidas. O vírus não é uma questão médica, ele é político. Essa conta não é dos professores, é do Governo.
* O autor é Sociólogo.