Carlos Prestes
Cíntia Nascimento
Leonaldo Santos
Taís Nogueira
O QUE QUERES? (Para uma teoria da
Ciência e da Crítica)
O que queres?
Se na morte fatídica
Foge do ser a física robustez
E no complexo biológico
Do teu corpo
Uma ciência natural trabalha,
pesquisa
Faz anotações da causa mortis?
O que queres?
Se a morte moral suga os valores
Da consciência humana;
Se o ato premeditado
Não justifica a inconsciência
Nem desculpa o inconsequente
Que observa o mundo com olhos
insanos?
O que queres?
Se o logos guerreia
incessantemente
Contra o íntimo do homem; se o
homem
Se perde no conceito exato da
razão;
Se a razão permeia a emoção;
Se tudo isso é a práxis
Entre pensar e fazer, escrever e
viver?
Sim, diga, o que queres de mim?
Se a ética te observa o
comportamento;
Se a essência do que és contradiz
a tua história;
Se a história está para o homem
Como o saber está para o poder;
E a filosofia se acha
Em constantes divagações?
O que queres?
Se o homem, sem razão, perdeu a
razão;
Se o conceito de moderno
Virou tragicomédia;
Se o antigo virou peça de
bibelot,
E o catedrático historiador
Leva fama de contador de
história?
Não! Não me digas o que queres.
Se o capitalismo extermina
A igualdade nata; se a igualdade
É apenas um belo vocábulo;
Se o vocábulo é apenas
Um fragmentado instrumento
ideológico
De uma fragmentada utopia.
O que dizer?
Se a dúvida metódica
Leva ao conhecimento da primeira
verdade
E, assim, a Deus; se a evidência
É indubitável; e a verdadeira
filosofia
É uma metafísica raiz de árvore
Cujo tronco é a física?
O que dizer
Se a percepção é subjetiva
E os sentidos relativizam a
leitura
Do mundo; se na teoria
fenomenológica
O homem é aquilo que ele vive;
Se o verdadeiro não é real
E o real não é verdadeiro no
pensamento pontyano?
O que dizer?
Se o comportamento behaviorista
É ordenado e determinado, se o
homem
Não é livre de leis e regras
gerais;
Se o objeto skinneriano é sempre
exterior
Ao homem, e as variáveis fora do
organismo
Determinam o comportamento
observado?
O que dizer do evolucionismo
sociológico?
Se as representações aparentam a
realidade
Social; se o homem é
sócio-individual;
Se tudo se reduz ao fenômeno
material;
Se o começo de tudo está na
observação
Dos fatos; se a observação
subordina
a imaginação?
O que dizer do existencialismo
filosófico?
Se a imagem é sempre uma
destruição
Do objeto: nunca o objeto, nunca
o real;
Se o homem é a sua própria
experiência
Física, psicológica e social;
Se a intenção media
sujeito-objeto
E a liberdade é plena em sua
consciência?
O que dizer?
Se na filosofia da linguagem
marxista
A ideologia ocupa o seu ponto de
essência;
Se o homem é um ser físico,
histórico e social;
Se a sua cultura marca o seu
materialismo;
Se a linguagem
É a transição entre sujeito e
objeto?
O que queres, afinal?
Se a psicologia anda atenta à
subjetividade humana
Se as manifestações do homem
São visíveis, invisíveis,
singulares e genéricas;
Se há no ser íntimo
Uma cumplicidade físico-motora,
Intelectual, afetiva e social?
Não! Não me digas o que queres.
Pois te falei de Axiologia,
Axioma, Antropologia;
Filosofia, Práxis, Epistemologia;
Logos, Lógica, Filologia;
Dialética, Ética, Pragmatismo;
Política, Cultura, Sociologia;
Dúvida metódica, Física,
Metafísica;
Fenomenologia, Relativização,
Percepção;
Behaviorismo ordenado e
determinado;
Evolucionismo, Representação,
Observação;
Existencialismo, Imagem, Objeto;
Marxismo, Ideia, Materialismo;
Razão, Experiência, Criticismo.
Há conhecimentos e buscas
Ciências e descobertas
Experimentos e teorias
Mas o tempo que não domino
Me bate à memória a indagar
O que queres?
Se na solidão do meu olhar
expectante
Alcanço o alto e o horizonte
Percebo um pássaro voando em free
way
Uma miragem se auto reproduz
Na equidistante trilha
De um espaço terreno
E profundamente abstrato.
Eu... De pé, encaro o mundo.
O mundo me cerca de todos os
lados
Me empurra e berra em meus
ouvidos.
Os olhos flamejam, criticam
Sinto o exterior...
Só não lembrei de sentir a mim
mesmo.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por objetivo
fomentar uma discussão crítica a respeito de Immanuel Kant, relacionando-o com
a realidade educacional na qual estamos inseridos. Ademais, trata-se de um
trabalho simplificado na atuação das palavras empregadas, mas cujo conteúdo
deve contribuir significativamente para uma reflexão mais abrangente, realista
e crítica acerca da atuação do nosso sistema educacional, seus objetivos e
metodologias para alcançar um determinado fim, pois a devida compreensão da
obra deste pensador, poderá nos revelar importantes detalhes e minúcias que vêm
permeando toda a educação brasileira, tão influenciada pelos ideais iluministas
de “liberdade, igualdade e fraternidade” que contagiaram o mundo, e que, muitos
educadores, hoje, infelizmente, ainda não se deram conta desses fatos ou
simplesmente passaram por eles sem querer nota-los, o que é muito pior.
PENSADORES, PENSAMENTOS E
MOVIMENTOS
Os primeiros passos da profunda
renovação cultural do século XVIII ocorreram, ainda, no século XVII. Descartes,
John Locke e Isac Newton lançaram as bases daquilo que um século depois seria o
Iluminismo.
O Iluminismo, conhecido também
como Ilustração, possuía duas características comuns aos seus principais
teóricos: A crença na razão como guia para se chegar ao conhecimento e a
concepção do universo como máquina governada de leis próprias que poderiam ser
conhecidas pela ciência.
Isaac Newton contribuiu
decisivamente para uma mudança radical na visão de mundo quando aprofundou
teorias desenvolvidas por Copérnico, Kepler, Galileu, no Renascimento, e por
Descartes na primeira metade do século XVII, rejeitando a concepção medieval de
um universo imóvel e estático. Com ele, surge uma nova perspectiva de universo,
onde o movimento é considerado absoluto e o repouso, relativo. E esse movimento
não ocorre de forma anárquica, mas sim regido por leis físicas invariáveis que
podem ser conhecidas pelo homem através da ciência. O universo é, portanto,
segundo Newton, mecanicista.
A filosofia de Newton não excluía
a ideia de Deus, mas negava sua intervenção no cotidiano do universo, o qual
funcionaria por leis próprias, sem necessidade de uma força divina que zelasse
por seu movimento.
Os principais filósofos do
movimento iluminista foram Voltaire, Montesquieu e Rousseau.
O Mercantilismo, doutrina
econômica do absolutismo, seria condenada junto com ele. Os fisiocratas
afirmavam que o comércio era uma atividade econômica estéril e condenavam ainda
a intervenção do Estado na economia. Seu lema era: “Deixai fazer, deixai passar,
o mundo anda por si mesmo”. Hoje, vivemos uma outra realidade. A população
mundial cresceu, a tecnologia se desenvolveu, veio a revolução industrial, os
poderes monárquicos caíram em decadência, a nobreza perdeu autoridade e
prestígio frente ao comércio que se desenvolvia nos burgos, o comércio cresceu
com as grandes navegações, novas conquistas de terras além-mar que foram
colonizadas, surge uma nova classe social: a burguesia, a economia torna-se
globalizada. Essa é a nova realidade. Uma nação dependendo de outra nação
economicamente pra sobreviver. Ou seja, a economia está nas mãos de quem
administra o país.
Quanto ao Despotismo esclarecido,
caracterizou-se como uma tentativa de os soberanos modernizarem o país,
mantendo, ainda, uma política absolutista.
Os déspotas procuraram aplicar algumas ideias do iluminismo, sem a
participação do povo. Sua “boa vontade” para com o povo, traduzia-se nas
seguintes palavras: “tudo pelo povo, sem o povo”
Atente para as seguintes palavras
de Denis Diderot (1713-1784); “Nenhum homem recebeu da natureza o direito de
comandar os outros. A liberdade é um presente do céu, e cada indivíduo da mesma
espécie tem o direito de gozar dela logo que goze da razão” (FREITAS, 1977). É
possível gozar de uma liberdade plena sem limites? A razão se contrapõe ao
estado emocional ou se junta ao ele? Não há que ter um equilíbrio
(intermediação) entre razão e emoção? Esses dois estados d’alma separados não
levam o homem ao perigo do extremismo? Neste sentido, a liberdade não seria o
equilíbrio entre esses dois estados? Sim, porque sem esse cuidado não existiria
liberdade. Seria como se não houvesse leis de trânsito. Como alguém poderia
transitar livremente com seu carro pelas ruas de uma cidade sem colocar em
risco sua própria vida ou a vida de alguém? Aí é que entra a liberdade
administrada; é atribuído a François Marie Arouet, cujo pseudônimo é Voltaire
(1694-1778) o pensamento: “posso não concordar com o que dizes, mas defenderei
até a morte o direito que tem de dizer”. No entanto, essas palavras foram ditas
por Evelyn Beatrice (1868-1956) que assinava com o pseudônimo de S.G.
Tallentyre quando escreveu a biógrafa de Voltaire na obra intitulada The
friends of Voltaire (Os amigos de Voltaire), publicada em 1906. De qualquer
modo, essa frase se coaduna perfeitamente com a essência de suas ideias:
liberdade para se expressar, liberdade de imprensa, liberdade religiosa,
respeito à tolerância, separação entre igreja e Estado; Montesquieu (1689-1755)
em O espírito das leis propõe a separação e o equilíbrio dos poderes:
Executivo, Legislativo e Judiciário. Defendia o liberalismo, mas nunca foi um
democrata, pois possuía uma atitude de desprezo pelo povo, que ele classificava
de “ralé”. Há muitas dessas figuras hoje, que se dizem representantes do povo,
mas apenas o usam para os seus projetos de poder; exceção seja feita a Rousseau
(1712-1778) que, dificilmente, se enquadrava entre filósofos iluministas.
Naturalista, criticava aqueles que elevavam a razão à categoria de verdadeira
deusa. São dele as frases: “... perecereis se esqueceres que a terra pertence a
todos” e “para melhorar o estado social é preciso que todos tenham o
suficiente, e que ninguém tenha demasiado” (ROUSSEAU, 2013). Mas os
gananciosos, avarentos, não dariam ouvidos às palavras de um filósofo
naturalista, pois, grande parte das terras no Brasil e no mundo, está
concentrada nas mãos de poucas pessoas, assim como a riqueza. Isso quer dizer
que, a maior parte dos seres humanos não têm o suficiente para sobreviver, e,
outros, uma pequena porção, têm em excesso. O resultado disso é pobreza,
miséria extrema em muitas partes do mundo. E essa miséria gera violência, um
caos social. O que gerou isso, essa vontade de dominar sobre o outro da mesma
espécie, de maneira tão animalesca? Razão ou emoção? Ou as duas juntas?
No
Brasil, os ideais revolucionários que inspiraram as lutas de libertação
nacional, separando a colônia da metrópole – como na Inconfidência Mineira e na
própria agitação política que levou à proclamação da Independência – começou a
influenciar propostas liberais para a Educação, através da 1ª Constituição de
1824, na qual, segundo a professora Ester Buffa, da universidade Federal de São
Carlos, já estava prevista a educação gratuita para todos, sem qualquer
distinção.
As
exposições que norteiam o pensamento de kant, podem ser melhor compreendidas
quando relacionadas com o período anterior. O objeto do estudo de Kant,
indubitavelmente, fundamenta-se no princípio do desenvolvimento da razão
humana. Essa razão, cujo próprio Rousseau ironizou chamando-a de “deusa”, e que
era absorvida tão intensamente pelo sistema racionalista da época (apoiado nas
ideias de René Descartes), tinha, na metafísica, a supremacia do conhecimento,
relegando a experiencia a um plano secundário. A transgressão do domínio da
experiencia pela razão na ânsia de chegar a conhecimentos de objetos, dos quais
as únicas fontes de informação que possuía estavam restritas a conceitos que,
em si, inviabilizavam qualquer pretensão
de se chegar a dados objetivos, despertou em Kant, aquilo que ele chamou
de ideias, por haver uma proximidade com as ideias platônicas, pois estes
conceitos ou ideias consistiam em representações de objetos que apenas eram
pensados logicamente e fundamentados nas aparências em si, supostamente
existentes. Essas ideias que eram entendidas como instrumentos heurísticos (do
grego heurísko: descobrir, inventar, obter) consistiam em conjuntos de
métodos e regras (ou mesmo estratégias) que visavam a resolução de um problema
de modo mais eficiente. Solucionar um problema, racionalmente, significava
abusar dos conceitos de entendimento que estavam voltados para a determinação
da experiencia, pois, como afirmava Hobbes:
O estado de natureza é um estado
de injustiça e violência, sendo necessário que o abandonemos para nos
submetermos à compulsão da lei. Esta última, limita a nossa liberdade
exclusivamente com o fato de que possa coexistir com a liberdade de todos os
demais e, exatamente, devido a isso, com o bem comum (HOBBES, 1988).
Ora, a razão determinava o que
era e o que não era, julgando e, ao mesmo tempo, condenando qualquer ato sem
nenhuma espécie de mediador. Diante da possibilidade de a razão transformar-se
numa irrazão levada pelo dogmatismo irrefreável que assolava seu tempo, Kant,
com uma visão extremamente crítica, procurou estabelecer limites e equilíbrio à
onisciência e onipotência da razão humana, através de um Método crítico baseado
nas faculdades da sensibilidade e entendimento, intermediados pela imaginação
que mediante a cooperação recíproca
dessas faculdades, unificando percepções sob conceitos, o sujeito produz a
experiencia, que é um conhecimento real e empírico, constituído por uma conexão
de percepções apuradas pelo entendimento. Assim, a experiencia envolve dados a
priori. O entendimento nada pode intervir e os sentidos nada pensar. O
conhecimento só pode surgir de sua reunião (ROHDEN, 1986, p. 81).
Dizia Kant: “Nossa época é a
verdadeira época da crítica, a qual tudo tem de submeter-se” (KANT, 1985, p. 4,
apud KEINERT, 2006, p. 15-16). A razão é limitada pelo senso crítico.
A crítica é livre e não pode ser
freada ou constrangida pela razão sem que lhe cause descrédito. Por isso, a
razão só existe como fonte de conhecimento verdadeiro, quando, por ela, passeia
a liberdade de investigação que, após um longo processo de reconhecimento,
dá-lhe o seu aval de confiabilidade. Deste modo, a liberdade é limitada pelo
civismo, assim como a própria razão que só passa a ter sentido e existência em
função dessa liberdade, pois, longe dela, a razão é uma irracionalidade, uma
quase aberração mental que faz o homem tornar-se prepotente e autossuficiente.
Segundo Kant, o sujeito está
ligado ao objeto na formação de um conhecimento. A razão deixa de ser absoluta
e torna-se limitada, posto que a mesma é incapaz de conhecer as coisas em si. O
sujeito só se relaciona com o objeto, quando esse se mostra a ele. Assim, a
razão explica o objeto que o sujeito vê, e não o objeto em si. São palavras de
Kant: “Eis, pois, o limite da razão: jamais conhecer o ser em si” (SOARES,
1999) e o objeto é conhecido por nós a
partir do contato que temos com ele. Nesse contato, criamos grande parte do
objeto quando o transformamos em ideia, de forma que, para Kant, a ideia assume
uma importância maior que o objeto (Ibidem, 1999).
Kant nos expõe duas formas de
conhecimento que, na verdade, estão interligados. O juízo, a priori, é aquele
onde as ideias são levadas em consideração, sem precisar fazer experiencias. O
juízo, a posteriori, necessita de experiencias para ser confirmado. Essas
categorias de conhecimento também podem ser estudadas de forma analítica e
sintética. Explicando melhor, o conhecimento do juízo, a priori, é um
conhecimento analítico, ou seja, eles independem da experiencia. Já o juízo
sintético, que é o a posteriori, vem por meio da experiência e do juízo
analítico. Nesse segundo momento, há uma interrelação dos juízos de
conhecimento. Segundo Rohden:
Na medida que a síntese operada
no juízo for meramente formal, teremos conhecimento de estruturas da
experiencia, como o geométrico ou o físico. Esse fato implica a distinção de
tipos de juízos diversos: juízos a priori, que não se fundem imediatamente na
experiencia, e juízos a posteriori, que se fundam imediatamente nela (ROHDEN,
1986, p. 82).
Para Kant, a sensibilidade e o
entendimento devem fundir-se (ou completar-se) para, assim, haver o real
conhecimento, pois sem a sensibilidade nenhum objeto
nos seria dado, e, sem entendimento, nenhum conceito seria pensado. Portanto,
tanto é necessário tornar os conceitos sensíveis (isto é, acrescentar-lhes o
objeto na intuição) quanto tornar as suas intuições compreensíveis (isto é,
sobre conceitos) (KANT, 2003, p. 57).
Em Kant, a ação humana é
determinada pela razão. No entanto, o indivíduo deve estar livre para fazer
críticas a essa razão e, assim, conscientemente, estabelecer suas regras de
conduta. Logo, precisamos entender que o indivíduo deve exercer perante a razão,
a sua autonomia como sujeito. Esta autonomia está diretamente vinculada com a
liberdade e a capacidade de criticar e criticar-se. Portanto, para Kant, a
liberdade é o eixo precursor de toda a sua análise.
Kant critica leis impostas, as
quais indicam ao homem que ele deve seguir este ou aquele caminho. Para ele, o
homem por si só, e sua consciência, livre, é capaz de criar uma lei autônoma,
na qual seus atos podem estar de acordo com a lei natural, universal. Kant
explica que “a ação é presidida perla razão, mediante a qual o indivíduo
procede conscientemente e estabelece regras de conduta. A autonomia, isto é, a
existência de leis livres, é considerada a grande descoberta da segunda
crítica” (KANT, 2003, p. 134).
Para Kant, o juízo é uma
faculdade ligada ao sentimento de prazer e à capacidade de reflexão. Nestes
juízos, temos um objeto, o qual o fim não pode ser determinado conceitualmente,
pois esse juízo de gosto não é algo objetivo, mas subjetivo, onde as pessoas
podem ter diferentes visões acerca de um mesmo objeto, e é nessas determinações
subjetivas que podemos expressar o prazer que sentimos diante de algo que
consideramos belo. Kant faz a seguinte colocação:
Esse julgamento meramente
subjetivo (estético) do objeto, ou da representação pela qual é dada, precede o
prazer relativo a ele, e é o fundamento desse prazer face a faculdades de
conhecimento; mas é somente sobre aquela universalidade de condições subjetivas
do julgamento do objeto, que se funda essa validade subjetiva universal da
satisfação que vinculamos como representação do objeto que determinamos belo
(KANT, 1974, p. 220).
“A sociedade, para Kant, é um
passo racional, pelo qual o homem sai do estado meramente natural e adquire
capacidade de determinar livremente o que quer fazer de si” (MESQUITA, 2014). É
nela que ocorre uma espécie de “luta de homens”, onde cada um tenta se sobrepor
ao outro, e é nesse nível social que o homem vive entre duas tendencias
conflitantes: uma, de perseguir seus interesses particulares, não importando
quem poderá afetar, desde que, com isso, consiga alcançar os seus interesses; e
outra, onde o homem deve agir racionalmente e tentar se socializar na
comunidade, e, também, seguir suas regras.
Ele defendia, também, uma
transformação nas leis por reformas contínuas e críticas, e não por meio de
revolução, na qual, essas transformações poderiam acontecer de forma imediata,
e não era bem assim que ele propunha, apesar de simpatizar com algumas revoluções.
Por outro lado, Kant também critica a relação do Estado com o cidadão, no
sentido de que o Estado desconsidera a hipótese, ou até mesmo impede o
desenvolvimento intelectual e a participação significativa do cidadão perante a
sociedade. Observe a seguinte consideração de Kant:
... Mas enquanto os estudos
continuarem a despender todas as suas forças nos seus vãos e brutais objetivos
de expansão, impedindo, assim, o lento esforço de formação interna do modo de
pensar dos seus cidadãos e privando-os mesmo de todo o apoio nesse sentido...
(KANT, 1985, apud KEINERT, 2006).
ANÁLISE CRÍTICA DO PENSAMENTO DE
KANT RELACIONADO COM A EDUCAÇÃO
Foram os ideais revolucionários
burgueses que nos influenciaram e nos legaram as principais instituições
políticas, como a República Representativa, o Congresso Nacional, os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário, os códigos legais e as bandeiras de
liberdade, Igualdade e Fraternidade. E foram esses ideais também que nos
deixaram uma herança na área da educação, da qual, poucas vezes se ouve falar,
mas que é muito presente (NOVA ESCOLA, 1989.
Na constituição de 1824 já
estavam previstas propostas liberais para a educação, como a gratuidade do
ensino para todos, sem qualquer distinção.
Conforme afirma Eliana Marta
Teixeira Lopes, professora de História da Educação da Universidade Federal de
Minas Gerais e autora do livro As Origens da Educação Pública: A Instrução na
Revolução Burguesa do Século XVIII:
A Educação gratuita acenava com a
possibilidade de igualização social pela instituição universal. A Educação
assumiu o papel de redentora social. Mas esse mesmo Estado que queria instruir
e igualizar os indivíduos, transformando todos os cidadãos, legitimaria e
protegeria a propriedade privada (LOPES, 1981).
O método racionalista adotado no
Brasil, que abdicou do ensino religioso em prol de um ensino laico (sem
religião) inspirado nos ideais de 1789 não frutificou em nosso país. Nem
poderia, pois as desigualdades sociais eram gritantes, e idealizar não é o mesmo
que experimentar.
Kant procurou desenvolver um
método em que a razão pudesse ser avaliada e orientada, possibilitando um
relacionamento mais crítico na área da educação. Esse método, que consiste em
critérios que são regidos por regras e normas, assemelhando-se ao que nós vemos
hoje, porém, prima pela reflexão, pelo questionamento, enquanto que, na
educação atual, ainda que exista, é raro, pois, a maioria das escolas, ainda
impõem aos professores, planos de curso, planos de aula, metodologias que
objetivavam a formação de estudantes para o mercado de trabalho, onde o que
menos importa é pensar, questionar.
Para Kant, o homem sai do estado
meramente natural e adquire capacidade de determinar livremente o que quer
fazer de si. Mas, ao nível social, os instintos e o egoísmo continuam
presentes, e o homem se debate entre duas tendencias conflitantes: perseguir
seus interesses particulares, instrumentalizando outros homens a seu serviço,
ou, seguindo a razão, socializar-se e moralizar-se (KANT, 2003, p. 137-138).
Vivemos em uma sociedade que cobra deveres e obrigações, a qual está vinculado
o sistema educacional. Nesse contexto, a educação compreende uma visão
kantiana, onde os interesses particulares, a concorrência e a própria
socialização tornam o homem egoísta e individualista, pois está sempre
preocupado em ultrapassar obstáculos. Isso está presente na sala de aula, na
cobrança do professor, na disputa entre alunos para apresentar o melhor
trabalho, etc.
Kant também discriminava o tipo
de estudante com quem ele gostava de trabalhar, durante o período em que
ministrou aula. Para ele, o estudante “tolo” (que pouco sabia) era impossível
de ser educado. Por outro lado, o “gênio” estudava por si mesmo e não necessitava
de ajuda. Restava o mediano, a quem ele participava os seus ensinamentos. Hoje,
trabalhamos com todos os níveis de dificuldades e aprendizados em todos os
meios sociais, mas o preconceito em relação a alunos mais carentes ou que se
sobressaem em sala de aula existe, e não podemos fechar os olhos e fingir que
essas coisas não estão acontecendo.
A moralidade, em Kant, desliga o
homem de Deus, e ele passa a ser livre, o que é fundamental para a existência
do cumprimento do dever e, sem ela, essa exigência perde o seu significado
(Isso se dá na concepção kantiana, uma vez que, a concepção bíblica ou cristã,
ao contrário do que defendia Kant, aponta que Deus criou os próprios anjos com
liberdade de decisão, e essa liberdade, o livre arbítrio, foi repassado ao ser
humano). Regido pelo respeito ao dever, “o sujeito kantiano é responsável pelo
seu conhecimento e pelo seu comportamento diante do mundo” (ROHDEN, 1986). A
pergunta é: a educação dá-nos essa liberdade, hoje, para cumprirmos de acordo
com nossa consciência, o nosso dever? Essa liberdade não compromete a moral e
ética na educação? Como avaliar a moral quando a minha consciência do dever me
diz uma coisa que extrapola as normas e as regras civis? Dependendo do tipo de
educação que recebemos e em que circunstâncias recebemos, podemos primar por
uma moralização dos costumes regidos por normas e leis, ou por uma liberdade
incondicional que questiona os tabus da moralização padronizada.
É importante formar estudantes
críticos, porém a própria criticidade corre o risco de se tornar absoluta
quando o educador, ao passar uma ideia para o aluno, tenta convence-lo de sua
veracidade, ao invés de fazê-lo pensar por si mesmo.
Diante dos argumentos
apresentados e, tendo como proposta de estudo, levar ao conhecimento de outros,
uma simplificação direta e objetiva sobre o pensamento de Kant,
contextualizando, fundamentando, citando e analisando equilibradamente a sua
relação com o meio educacional, é possível concluir que, mesmo diante da
complexidade de se estudar o pensamento tão profundo de Kant, houve um esforço
na abordagem do tema em discussão, de se mostrar um vislumbre, pelo menos, da
obra de Immanuel Kant, de forma objetiva e clara, para que, ao chegar às mãos
de pessoas que não tenham referência a respeito desse autor, possam ler e
entende-lo sem maiores complicações.
REFERENCIAS
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