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sábado, 25 de maio de 2024

LAPSUS

 






Um pai idoso e com Alzheimer. Um filho expulso de casa por ser gay e que agora volta pra cuidar desse pai doente. Frente à frente, eles revisitam a trajetória dessa relação, relembrando momentos de afeto e mágoa na busca de uma redenção. Um segredo entre eles.


O argumento de Marton Maués resulta na emocionante dramaturgia costurada por Mário Zumba e recheada de dor, perdão e amor. Assim nasce o projeto LAPSUS, da leitura dramática realizada pelos atores Marton Maués e Mário Zumba. Desde janeiro de 2023 o projeto já foi apresentado em residências, jornadas pedagógicas, centros culturais, pousadas, livrarias, quintais e na 1ª Mostra de Teatro Koringa.


E agora estará no Nosso Pátio Cultural.


Não perde!


Vamos ao teatro!

🎭🎭🎭🎭🎭🎭

sexta-feira, 17 de maio de 2024

Memórias de um professor de escola pública aposentado no Estado do Pará

 





           A escritora e romancista espanhola Rosa Montero em um de seus livros importantes denominado de A Louca da Casa, que mesmo desmemoriada confessa que conseguiu escrever esta obra de reminiscências, "suprindo sua amnésia com uma incrível imaginação", como disse Zuenir Ventura no livro Minhas Histórias dos Outros, mesmo sabendo do fundamental resgate das memórias e histórias de uma sociedade como historiador ou mesmo de uma história de vida. 





           Nós que escrevemos as memórias através dos fatos através das boas lembranças ou pesquisas e mesmo em muitos casos fazer valer com que o esquecimento reveja e repense momentos históricos deixados de lados, buscamos repensar como no dia de hoje uma data considerada para este blogueiro, que completa 35 anos de atuação no magistério na rede estadual.      

        Sendo um educador da área de História, logo que ingressei dois anos antes em escolas particulares e depois na escola pública sempre estava preocupado com os problemas das escolas por onde passei, as vezes sendo o “amigo da escola” para solucionar situações de interesses pedagógicos, administrativos e até políticos relacionados com o ambiente escolar, sendo assim, assumindo responsabilidades por uma educação digna e de qualidade.

        Sempre fui questionador, observador e defensor da categoria dos educadores e alun@s , estava analisando e refletindo no que podia melhorar, às vezes voluntariamente e motivava mais profissionais para seguir seus ritmos de atividades.

     Como educador, sempre me senti realizado, amava o que fazia e diversas vezes recebia o reconhecimento; assim como, encontrava desafios para a concretização de meus objetivos, idealizando projetos eficazes e de intervenções para comunidade escolar. 

         


           Como a memória nos faz rever a relação do passado com o presente, relembrar o dia 17 de maio de 1989, uma segunda-feira, no turno da noite, no município de Terra Santa, dava início a esta atividade profissional lotado no Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME no Ensino Médio, após a apresentação na Unidade Regional de Educação - URE do município de Santarém.




           O Sistema de Organização Modular de Ensino - SOME está na veia, não podemos negar, que foram 29 anos desenvolvendo nossas práticas educativas nesta política púiblica e como construtor de sonhos ao longo dessa trajetória, foram excelências experiências e trocas de aprendizagens. Essas imagens retratam esta história de vida. 





           Como escola de vida, o SOME tem contribuído para a ampliação do conhecimento nos interiores do Estado do Pará e atualmente com diversos estudos acadêmicos, tem aprofundado as pesquisas em vários aspectos. O Sistema Modular é genuinamente paraense e serve como referência para inúmeros municípios, estados e países. É uma política pública muita questionada e discutida nas faculdades e universidades.  



  

           Como ex-educador e pesquisador do Sistema Modular, podemos afirmar que com esta dimensão territorial de nosso Estado, ainda vai demorar bastante e que esses 44 anos de implantação atendendo os filhos dos trabalhadores rurais, quilombolas, ribeirinhos, assentados, indígenas nos campos paraenses proporcionará excelentes profissionais como tem feito em seus objetivos. 




           E, assim, vamos construindo nossas histórias e nossas memórias!




































terça-feira, 14 de maio de 2024

REFLEXOS DO PENSAMENTO KANTIANO NA EDUCAÇÃO



       

 

Carlos Prestes

Cíntia Nascimento

Leonaldo Santos

Taís Nogueira 

 

 

 

O QUE QUERES? (Para uma teoria da Ciência e da Crítica)

 

O que queres?

Se na morte fatídica

Foge do ser a física robustez

E no complexo biológico

Do teu corpo

Uma ciência natural trabalha, pesquisa

Faz anotações da causa mortis?

 

O que queres?

Se a morte moral suga os valores

Da consciência humana;

Se o ato premeditado

Não justifica a inconsciência

Nem desculpa o inconsequente

Que observa o mundo com olhos insanos?

 

O que queres?

Se o logos guerreia incessantemente

Contra o íntimo do homem; se o homem

Se perde no conceito exato da razão;

Se a razão permeia a emoção;

Se tudo isso é a práxis

Entre pensar e fazer, escrever e viver?

 

Sim, diga, o que queres de mim?

Se a ética te observa o comportamento;

Se a essência do que és contradiz a tua história;

Se a história está para o homem

Como o saber está para o poder;

E a filosofia se acha

Em constantes divagações?

 

O que queres?

Se o homem, sem razão, perdeu a razão;

Se o conceito de moderno

Virou tragicomédia;

Se o antigo virou peça de bibelot,

E o catedrático historiador

Leva fama de contador de história?

 

Não! Não me digas o que queres.

Se o capitalismo extermina

A igualdade nata; se a igualdade

É apenas um belo vocábulo;

Se o vocábulo é apenas

Um fragmentado instrumento ideológico

De uma fragmentada utopia.

 

O que dizer?

Se a dúvida metódica

Leva ao conhecimento da primeira verdade

E, assim, a Deus; se a evidência

É indubitável; e a verdadeira filosofia

É uma metafísica raiz de árvore

Cujo tronco é a física?

 

O que dizer

Se a percepção é subjetiva

E os sentidos relativizam a leitura

Do mundo; se na teoria fenomenológica

O homem é aquilo que ele vive;

Se o verdadeiro não é real

E o real não é verdadeiro no pensamento pontyano?

 

O que dizer?

Se o comportamento behaviorista

É ordenado e determinado, se o homem

Não é livre de leis e regras gerais;

Se o objeto skinneriano é sempre exterior

Ao homem, e as variáveis fora do organismo

Determinam o comportamento observado?

 

O que dizer do evolucionismo sociológico?

Se as representações aparentam a realidade

Social; se o homem é sócio-individual;

Se tudo se reduz ao fenômeno material;

Se o começo de tudo está na observação

Dos fatos; se a observação subordina

 a imaginação?

 

O que dizer do existencialismo filosófico?

Se a imagem é sempre uma destruição

Do objeto: nunca o objeto, nunca o real;

Se o homem é a sua própria experiência

Física, psicológica e social;

Se a intenção media sujeito-objeto

E a liberdade é plena em sua consciência?

 

O que dizer?

Se na filosofia da linguagem marxista

A ideologia ocupa o seu ponto de essência;

Se o homem é um ser físico, histórico e social;

Se a sua cultura marca o seu materialismo;

Se a linguagem

É a transição entre sujeito e objeto?

 

O que queres, afinal?

Se a psicologia anda atenta à subjetividade humana

Se as manifestações do homem

São visíveis, invisíveis, singulares e genéricas;

Se há no ser íntimo

Uma cumplicidade físico-motora,

Intelectual, afetiva e social?

 

Não! Não me digas o que queres.

Pois te falei de Axiologia, Axioma, Antropologia;

Filosofia, Práxis, Epistemologia;

Logos, Lógica, Filologia;

Dialética, Ética, Pragmatismo;

Política, Cultura, Sociologia;

Dúvida metódica, Física, Metafísica;

 

Fenomenologia, Relativização, Percepção;

Behaviorismo ordenado e determinado;

Evolucionismo, Representação, Observação;

Existencialismo, Imagem, Objeto;

Marxismo, Ideia, Materialismo;

Razão, Experiência, Criticismo.

 

Há conhecimentos e buscas

Ciências e descobertas

Experimentos e teorias

Mas o tempo que não domino

Me bate à memória a indagar

O que queres?

Se na solidão do meu olhar expectante

Alcanço o alto e o horizonte

Percebo um pássaro voando em free way

Uma miragem se auto reproduz

Na equidistante trilha

De um espaço terreno

E profundamente abstrato.

Eu... De pé, encaro o mundo.

O mundo me cerca de todos os lados

Me empurra e berra em meus ouvidos.

Os olhos flamejam, criticam

Sinto o exterior...

Só não lembrei de sentir a mim mesmo.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

Este trabalho tem por objetivo fomentar uma discussão crítica a respeito de Immanuel Kant, relacionando-o com a realidade educacional na qual estamos inseridos. Ademais, trata-se de um trabalho simplificado na atuação das palavras empregadas, mas cujo conteúdo deve contribuir significativamente para uma reflexão mais abrangente, realista e crítica acerca da atuação do nosso sistema educacional, seus objetivos e metodologias para alcançar um determinado fim, pois a devida compreensão da obra deste pensador, poderá nos revelar importantes detalhes e minúcias que vêm permeando toda a educação brasileira, tão influenciada pelos ideais iluministas de “liberdade, igualdade e fraternidade” que contagiaram o mundo, e que, muitos educadores, hoje, infelizmente, ainda não se deram conta desses fatos ou simplesmente passaram por eles sem querer nota-los, o que é muito pior.

 

 

PENSADORES, PENSAMENTOS E MOVIMENTOS

 

Os primeiros passos da profunda renovação cultural do século XVIII ocorreram, ainda, no século XVII. Descartes, John Locke e Isac Newton lançaram as bases daquilo que um século depois seria o Iluminismo.

O Iluminismo, conhecido também como Ilustração, possuía duas características comuns aos seus principais teóricos: A crença na razão como guia para se chegar ao conhecimento e a concepção do universo como máquina governada de leis próprias que poderiam ser conhecidas pela ciência.

Isaac Newton contribuiu decisivamente para uma mudança radical na visão de mundo quando aprofundou teorias desenvolvidas por Copérnico, Kepler, Galileu, no Renascimento, e por Descartes na primeira metade do século XVII, rejeitando a concepção medieval de um universo imóvel e estático. Com ele, surge uma nova perspectiva de universo, onde o movimento é considerado absoluto e o repouso, relativo. E esse movimento não ocorre de forma anárquica, mas sim regido por leis físicas invariáveis que podem ser conhecidas pelo homem através da ciência. O universo é, portanto, segundo Newton, mecanicista.

A filosofia de Newton não excluía a ideia de Deus, mas negava sua intervenção no cotidiano do universo, o qual funcionaria por leis próprias, sem necessidade de uma força divina que zelasse por seu movimento.

Os principais filósofos do movimento iluminista foram Voltaire, Montesquieu e Rousseau.

O Mercantilismo, doutrina econômica do absolutismo, seria condenada junto com ele. Os fisiocratas afirmavam que o comércio era uma atividade econômica estéril e condenavam ainda a intervenção do Estado na economia. Seu lema era: “Deixai fazer, deixai passar, o mundo anda por si mesmo”. Hoje, vivemos uma outra realidade. A população mundial cresceu, a tecnologia se desenvolveu, veio a revolução industrial, os poderes monárquicos caíram em decadência, a nobreza perdeu autoridade e prestígio frente ao comércio que se desenvolvia nos burgos, o comércio cresceu com as grandes navegações, novas conquistas de terras além-mar que foram colonizadas, surge uma nova classe social: a burguesia, a economia torna-se globalizada. Essa é a nova realidade. Uma nação dependendo de outra nação economicamente pra sobreviver. Ou seja, a economia está nas mãos de quem administra o país.

Quanto ao Despotismo esclarecido, caracterizou-se como uma tentativa de os soberanos modernizarem o país, mantendo, ainda, uma política absolutista.  Os déspotas procuraram aplicar algumas ideias do iluminismo, sem a participação do povo. Sua “boa vontade” para com o povo, traduzia-se nas seguintes palavras: “tudo pelo povo, sem o povo”

Atente para as seguintes palavras de Denis Diderot (1713-1784); “Nenhum homem recebeu da natureza o direito de comandar os outros. A liberdade é um presente do céu, e cada indivíduo da mesma espécie tem o direito de gozar dela logo que goze da razão” (FREITAS, 1977). É possível gozar de uma liberdade plena sem limites? A razão se contrapõe ao estado emocional ou se junta ao ele? Não há que ter um equilíbrio (intermediação) entre razão e emoção? Esses dois estados d’alma separados não levam o homem ao perigo do extremismo? Neste sentido, a liberdade não seria o equilíbrio entre esses dois estados? Sim, porque sem esse cuidado não existiria liberdade. Seria como se não houvesse leis de trânsito. Como alguém poderia transitar livremente com seu carro pelas ruas de uma cidade sem colocar em risco sua própria vida ou a vida de alguém? Aí é que entra a liberdade administrada; é atribuído a François Marie Arouet, cujo pseudônimo é Voltaire (1694-1778) o pensamento: “posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até a morte o direito que tem de dizer”. No entanto, essas palavras foram ditas por Evelyn Beatrice (1868-1956) que assinava com o pseudônimo de S.G. Tallentyre quando escreveu a biógrafa de Voltaire na obra intitulada The friends of Voltaire (Os amigos de Voltaire), publicada em 1906. De qualquer modo, essa frase se coaduna perfeitamente com a essência de suas ideias: liberdade para se expressar, liberdade de imprensa, liberdade religiosa, respeito à tolerância, separação entre igreja e Estado; Montesquieu (1689-1755) em O espírito das leis propõe a separação e o equilíbrio dos poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Defendia o liberalismo, mas nunca foi um democrata, pois possuía uma atitude de desprezo pelo povo, que ele classificava de “ralé”. Há muitas dessas figuras hoje, que se dizem representantes do povo, mas apenas o usam para os seus projetos de poder; exceção seja feita a Rousseau (1712-1778) que, dificilmente, se enquadrava entre filósofos iluministas. Naturalista, criticava aqueles que elevavam a razão à categoria de verdadeira deusa. São dele as frases: “... perecereis se esqueceres que a terra pertence a todos” e “para melhorar o estado social é preciso que todos tenham o suficiente, e que ninguém tenha demasiado” (ROUSSEAU, 2013). Mas os gananciosos, avarentos, não dariam ouvidos às palavras de um filósofo naturalista, pois, grande parte das terras no Brasil e no mundo, está concentrada nas mãos de poucas pessoas, assim como a riqueza. Isso quer dizer que, a maior parte dos seres humanos não têm o suficiente para sobreviver, e, outros, uma pequena porção, têm em excesso. O resultado disso é pobreza, miséria extrema em muitas partes do mundo. E essa miséria gera violência, um caos social. O que gerou isso, essa vontade de dominar sobre o outro da mesma espécie, de maneira tão animalesca? Razão ou emoção? Ou as duas juntas?

               No Brasil, os ideais revolucionários que inspiraram as lutas de libertação nacional, separando a colônia da metrópole – como na Inconfidência Mineira e na própria agitação política que levou à proclamação da Independência – começou a influenciar propostas liberais para a Educação, através da 1ª Constituição de 1824, na qual, segundo a professora Ester Buffa, da universidade Federal de São Carlos, já estava prevista a educação gratuita para todos, sem qualquer distinção.

               As exposições que norteiam o pensamento de kant, podem ser melhor compreendidas quando relacionadas com o período anterior. O objeto do estudo de Kant, indubitavelmente, fundamenta-se no princípio do desenvolvimento da razão humana. Essa razão, cujo próprio Rousseau ironizou chamando-a de “deusa”, e que era absorvida tão intensamente pelo sistema racionalista da época (apoiado nas ideias de René Descartes), tinha, na metafísica, a supremacia do conhecimento, relegando a experiencia a um plano secundário. A transgressão do domínio da experiencia pela razão na ânsia de chegar a conhecimentos de objetos, dos quais as únicas fontes de informação que possuía estavam restritas a conceitos que, em si, inviabilizavam qualquer pretensão  de se chegar a dados objetivos, despertou em Kant, aquilo que ele chamou de ideias, por haver uma proximidade com as ideias platônicas, pois estes conceitos ou ideias consistiam em representações de objetos que apenas eram pensados logicamente e fundamentados nas aparências em si, supostamente existentes. Essas ideias que eram entendidas como instrumentos heurísticos (do grego heurísko: descobrir, inventar, obter) consistiam em conjuntos de métodos e regras (ou mesmo estratégias) que visavam a resolução de um problema de modo mais eficiente. Solucionar um problema, racionalmente, significava abusar dos conceitos de entendimento que estavam voltados para a determinação da experiencia, pois, como afirmava Hobbes:

 

O estado de natureza é um estado de injustiça e violência, sendo necessário que o abandonemos para nos submetermos à compulsão da lei. Esta última, limita a nossa liberdade exclusivamente com o fato de que possa coexistir com a liberdade de todos os demais e, exatamente, devido a isso, com o bem comum (HOBBES, 1988).

 

Ora, a razão determinava o que era e o que não era, julgando e, ao mesmo tempo, condenando qualquer ato sem nenhuma espécie de mediador. Diante da possibilidade de a razão transformar-se numa irrazão levada pelo dogmatismo irrefreável que assolava seu tempo, Kant, com uma visão extremamente crítica, procurou estabelecer limites e equilíbrio à onisciência e onipotência da razão humana, através de um Método crítico baseado nas faculdades da sensibilidade e entendimento, intermediados pela imaginação que mediante a cooperação recíproca dessas faculdades, unificando percepções sob conceitos, o sujeito produz a experiencia, que é um conhecimento real e empírico, constituído por uma conexão de percepções apuradas pelo entendimento. Assim, a experiencia envolve dados a priori. O entendimento nada pode intervir e os sentidos nada pensar. O conhecimento só pode surgir de sua reunião (ROHDEN, 1986, p. 81). 


Dizia Kant: “Nossa época é a verdadeira época da crítica, a qual tudo tem de submeter-se” (KANT, 1985, p. 4, apud KEINERT, 2006, p. 15-16). A razão é limitada pelo senso crítico.


A crítica é livre e não pode ser freada ou constrangida pela razão sem que lhe cause descrédito. Por isso, a razão só existe como fonte de conhecimento verdadeiro, quando, por ela, passeia a liberdade de investigação que, após um longo processo de reconhecimento, dá-lhe o seu aval de confiabilidade. Deste modo, a liberdade é limitada pelo civismo, assim como a própria razão que só passa a ter sentido e existência em função dessa liberdade, pois, longe dela, a razão é uma irracionalidade, uma quase aberração mental que faz o homem tornar-se prepotente e autossuficiente.


Segundo Kant, o sujeito está ligado ao objeto na formação de um conhecimento. A razão deixa de ser absoluta e torna-se limitada, posto que a mesma é incapaz de conhecer as coisas em si. O sujeito só se relaciona com o objeto, quando esse se mostra a ele. Assim, a razão explica o objeto que o sujeito vê, e não o objeto em si. São palavras de Kant: “Eis, pois, o limite da razão: jamais conhecer o ser em si” (SOARES, 1999) e o objeto é conhecido por nós a partir do contato que temos com ele. Nesse contato, criamos grande parte do objeto quando o transformamos em ideia, de forma que, para Kant, a ideia assume uma importância maior que o objeto (Ibidem, 1999). 


Kant nos expõe duas formas de conhecimento que, na verdade, estão interligados. O juízo, a priori, é aquele onde as ideias são levadas em consideração, sem precisar fazer experiencias. O juízo, a posteriori, necessita de experiencias para ser confirmado. Essas categorias de conhecimento também podem ser estudadas de forma analítica e sintética. Explicando melhor, o conhecimento do juízo, a priori, é um conhecimento analítico, ou seja, eles independem da experiencia. Já o juízo sintético, que é o a posteriori, vem por meio da experiência e do juízo analítico. Nesse segundo momento, há uma interrelação dos juízos de conhecimento. Segundo Rohden:

 

Na medida que a síntese operada no juízo for meramente formal, teremos conhecimento de estruturas da experiencia, como o geométrico ou o físico. Esse fato implica a distinção de tipos de juízos diversos: juízos a priori, que não se fundem imediatamente na experiencia, e juízos a posteriori, que se fundam imediatamente nela (ROHDEN, 1986, p. 82).

 

Para Kant, a sensibilidade e o entendimento devem fundir-se (ou completar-se) para, assim, haver o real conhecimento, pois sem a sensibilidade nenhum objeto nos seria dado, e, sem entendimento, nenhum conceito seria pensado. Portanto, tanto é necessário tornar os conceitos sensíveis (isto é, acrescentar-lhes o objeto na intuição) quanto tornar as suas intuições compreensíveis (isto é, sobre conceitos) (KANT, 2003, p. 57).

 

Em Kant, a ação humana é determinada pela razão. No entanto, o indivíduo deve estar livre para fazer críticas a essa razão e, assim, conscientemente, estabelecer suas regras de conduta. Logo, precisamos entender que o indivíduo deve exercer perante a razão, a sua autonomia como sujeito. Esta autonomia está diretamente vinculada com a liberdade e a capacidade de criticar e criticar-se. Portanto, para Kant, a liberdade é o eixo precursor de toda a sua análise.


Kant critica leis impostas, as quais indicam ao homem que ele deve seguir este ou aquele caminho. Para ele, o homem por si só, e sua consciência, livre, é capaz de criar uma lei autônoma, na qual seus atos podem estar de acordo com a lei natural, universal. Kant explica que “a ação é presidida perla razão, mediante a qual o indivíduo procede conscientemente e estabelece regras de conduta. A autonomia, isto é, a existência de leis livres, é considerada a grande descoberta da segunda crítica” (KANT, 2003, p. 134).

Para Kant, o juízo é uma faculdade ligada ao sentimento de prazer e à capacidade de reflexão. Nestes juízos, temos um objeto, o qual o fim não pode ser determinado conceitualmente, pois esse juízo de gosto não é algo objetivo, mas subjetivo, onde as pessoas podem ter diferentes visões acerca de um mesmo objeto, e é nessas determinações subjetivas que podemos expressar o prazer que sentimos diante de algo que consideramos belo. Kant faz a seguinte colocação:

 

Esse julgamento meramente subjetivo (estético) do objeto, ou da representação pela qual é dada, precede o prazer relativo a ele, e é o fundamento desse prazer face a faculdades de conhecimento; mas é somente sobre aquela universalidade de condições subjetivas do julgamento do objeto, que se funda essa validade subjetiva universal da satisfação que vinculamos como representação do objeto que determinamos belo (KANT, 1974, p. 220).

 

“A sociedade, para Kant, é um passo racional, pelo qual o homem sai do estado meramente natural e adquire capacidade de determinar livremente o que quer fazer de si” (MESQUITA, 2014). É nela que ocorre uma espécie de “luta de homens”, onde cada um tenta se sobrepor ao outro, e é nesse nível social que o homem vive entre duas tendencias conflitantes: uma, de perseguir seus interesses particulares, não importando quem poderá afetar, desde que, com isso, consiga alcançar os seus interesses; e outra, onde o homem deve agir racionalmente e tentar se socializar na comunidade, e, também, seguir suas regras.


Ele defendia, também, uma transformação nas leis por reformas contínuas e críticas, e não por meio de revolução, na qual, essas transformações poderiam acontecer de forma imediata, e não era bem assim que ele propunha, apesar de simpatizar com algumas revoluções. Por outro lado, Kant também critica a relação do Estado com o cidadão, no sentido de que o Estado desconsidera a hipótese, ou até mesmo impede o desenvolvimento intelectual e a participação significativa do cidadão perante a sociedade. Observe a seguinte consideração de Kant:

 

... Mas enquanto os estudos continuarem a despender todas as suas forças nos seus vãos e brutais objetivos de expansão, impedindo, assim, o lento esforço de formação interna do modo de pensar dos seus cidadãos e privando-os mesmo de todo o apoio nesse sentido... (KANT, 1985, apud KEINERT, 2006).

 

 

ANÁLISE CRÍTICA DO PENSAMENTO DE KANT RELACIONADO COM A EDUCAÇÃO

              

Foram os ideais revolucionários burgueses que nos influenciaram e nos legaram as principais instituições políticas, como a República Representativa, o Congresso Nacional, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, os códigos legais e as bandeiras de liberdade, Igualdade e Fraternidade. E foram esses ideais também que nos deixaram uma herança na área da educação, da qual, poucas vezes se ouve falar, mas que é muito presente (NOVA ESCOLA, 1989.

Na constituição de 1824 já estavam previstas propostas liberais para a educação, como a gratuidade do ensino para todos, sem qualquer distinção.

Conforme afirma Eliana Marta Teixeira Lopes, professora de História da Educação da Universidade Federal de Minas Gerais e autora do livro As Origens da Educação Pública: A Instrução na Revolução Burguesa do Século XVIII:

 

A Educação gratuita acenava com a possibilidade de igualização social pela instituição universal. A Educação assumiu o papel de redentora social. Mas esse mesmo Estado que queria instruir e igualizar os indivíduos, transformando todos os cidadãos, legitimaria e protegeria a propriedade privada (LOPES, 1981).

 

O método racionalista adotado no Brasil, que abdicou do ensino religioso em prol de um ensino laico (sem religião) inspirado nos ideais de 1789 não frutificou em nosso país. Nem poderia, pois as desigualdades sociais eram gritantes, e idealizar não é o mesmo que experimentar.

Kant procurou desenvolver um método em que a razão pudesse ser avaliada e orientada, possibilitando um relacionamento mais crítico na área da educação. Esse método, que consiste em critérios que são regidos por regras e normas, assemelhando-se ao que nós vemos hoje, porém, prima pela reflexão, pelo questionamento, enquanto que, na educação atual, ainda que exista, é raro, pois, a maioria das escolas, ainda impõem aos professores, planos de curso, planos de aula, metodologias que objetivavam a formação de estudantes para o mercado de trabalho, onde o que menos importa é pensar, questionar.

Para Kant, o homem sai do estado meramente natural e adquire capacidade de determinar livremente o que quer fazer de si. Mas, ao nível social, os instintos e o egoísmo continuam presentes, e o homem se debate entre duas tendencias conflitantes: perseguir seus interesses particulares, instrumentalizando outros homens a seu serviço, ou, seguindo a razão, socializar-se e moralizar-se (KANT, 2003, p. 137-138). Vivemos em uma sociedade que cobra deveres e obrigações, a qual está vinculado o sistema educacional. Nesse contexto, a educação compreende uma visão kantiana, onde os interesses particulares, a concorrência e a própria socialização tornam o homem egoísta e individualista, pois está sempre preocupado em ultrapassar obstáculos. Isso está presente na sala de aula, na cobrança do professor, na disputa entre alunos para apresentar o melhor trabalho, etc.

Kant também discriminava o tipo de estudante com quem ele gostava de trabalhar, durante o período em que ministrou aula. Para ele, o estudante “tolo” (que pouco sabia) era impossível de ser educado. Por outro lado, o “gênio” estudava por si mesmo e não necessitava de ajuda. Restava o mediano, a quem ele participava os seus ensinamentos. Hoje, trabalhamos com todos os níveis de dificuldades e aprendizados em todos os meios sociais, mas o preconceito em relação a alunos mais carentes ou que se sobressaem em sala de aula existe, e não podemos fechar os olhos e fingir que essas coisas não estão acontecendo.

A moralidade, em Kant, desliga o homem de Deus, e ele passa a ser livre, o que é fundamental para a existência do cumprimento do dever e, sem ela, essa exigência perde o seu significado (Isso se dá na concepção kantiana, uma vez que, a concepção bíblica ou cristã, ao contrário do que defendia Kant, aponta que Deus criou os próprios anjos com liberdade de decisão, e essa liberdade, o livre arbítrio, foi repassado ao ser humano). Regido pelo respeito ao dever, “o sujeito kantiano é responsável pelo seu conhecimento e pelo seu comportamento diante do mundo” (ROHDEN, 1986). A pergunta é: a educação dá-nos essa liberdade, hoje, para cumprirmos de acordo com nossa consciência, o nosso dever? Essa liberdade não compromete a moral e ética na educação? Como avaliar a moral quando a minha consciência do dever me diz uma coisa que extrapola as normas e as regras civis? Dependendo do tipo de educação que recebemos e em que circunstâncias recebemos, podemos primar por uma moralização dos costumes regidos por normas e leis, ou por uma liberdade incondicional que questiona os tabus da moralização padronizada.

É importante formar estudantes críticos, porém a própria criticidade corre o risco de se tornar absoluta quando o educador, ao passar uma ideia para o aluno, tenta convence-lo de sua veracidade, ao invés de fazê-lo pensar por si mesmo.

Diante dos argumentos apresentados e, tendo como proposta de estudo, levar ao conhecimento de outros, uma simplificação direta e objetiva sobre o pensamento de Kant, contextualizando, fundamentando, citando e analisando equilibradamente a sua relação com o meio educacional, é possível concluir que, mesmo diante da complexidade de se estudar o pensamento tão profundo de Kant, houve um esforço na abordagem do tema em discussão, de se mostrar um vislumbre, pelo menos, da obra de Immanuel Kant, de forma objetiva e clara, para que, ao chegar às mãos de pessoas que não tenham referência a respeito desse autor, possam ler e entende-lo sem maiores complicações.

 

 

 

 

REFERENCIAS

 

COSTA, Luis césar Amad; MELLO, Leonel Itaussu A. História moderna e contemporânea. São Paulo (SP): Editora Scipione, 2004

 

DIDEROT, Denis. Autoridade política. In: FREITAS, Gustavo de. Novecentos textos e documentos de História. Lisboa: Plâtano, 1977.

 

HALL, Evelin Beatrice. The friends of Voltaire (Os amigos de Voltaire). Londres: Smith,1906.

 

HOBBES, Thomas. Leviatã. Editora Nova Cultura, 1988.

 

KANT, Immanuel. Crítica do juízo. Tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho. São Paulo: Abril, 1974 (coleção Os pensadores).

 

______. Crítica da Razão Prática. Tradução, introdução e notas de Valério Rohden. Edição bilíngue. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

 

______. Crítica da Razão Pura. In: KEINERT, Maurício Cardoso. Crítica e autonomia em Kant:  a forma legislativa entre determinação e reflexão. Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de Filosofia. São Paulo, dezembro de 2006.

 

LARRIUCCI, Edson. In: Rousseau, Jean Jacques. O contrato social (1762). Edson Larrucci (monitor da disciplina história das ideias políticas; Universidade de Uberaba (SP). Disponível em http://monitoriacienciapoliticablogspot.com/. Acesso em 3.mai.2023.

 

LOPES, Eliane Marta Teixeira. As Origens da Educação Pública: A Instrução na Revolução Burguesa do Século XVIII. São Paulo (SP): Loyola. 1981.

 

MESQUITA, Jéssica de Farias. O conceito de sociedade civil em Kant.  Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas – FFCH, Programa de Pós-Graduação em Filosofia – PPGF, Mestrado em Filosofia; Porto Alegre (RS), 2014.

 

REVISTA Nova Escola, ano IV, nº 31, junho, 1982, p. 42

 

RESENDE, Antônio. Curso de filosofia para professores e alunos do segundo grau e de graduação. 10 ed., cap.7, Rio de Janeiro (RJ): Zahar, 2001.

 

ROHDEN, Valério. O criticismo kantiano. In: REZENDE, Antônio (Org.). Curso de filosofia – para professores e alunos dos cursos do ensino médio e graduação. 15ª impressão; Rio de Janeiro (RJ): Zahar, 1986.

 

ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. Jean Jacques Rousseau; tradução de Vicente Sabino Júnior; São Paulo: Pilares, 2013.

 

SOARES, Raimunda Lucena Melo. Filosofia da educação: limites e possibilidades. Belém, Universidade Federal do Pará, 1999.


quinta-feira, 9 de maio de 2024

Anotações de um educador no interior do Estado do Pará

 

         

         Entre alguns aspectos interessantes que fazia anotações de nossas práticas educativas relacionadas com a iniciação a pesquisa nas trocas de experiências com os educandos encontramos nossas experiências com os outros alunos e alunas nos municípios e localidades nos rincões do Estado do Pará. 

 

           Nessas nossas viagens através do Sistema de Organização Modular de Ensino – SOME, política pública voltada para atender os filhos dos trabalhadores rurais, quilombolas, indígenas, camponeses, assentamentos, vicinais, estradas entre outras categorias adquirimos um relativo material coletado através de entrevistas com a prática do recurso metodológico da História Oral, utilizado de forma importante nas conversas e diálogos com os mais antigos moradores das comunidades. 

 

           Vale destacar que nas décadas de 80, 90 e início de 2000 não tínhamos essas tecnologias atuais. Muitas das produções realizadas juntamente com os alunos/alunas e mesmo individualmente, foram perdidas já que as vezes não conseguíamos organizar por falta de equipamentos adequados, mesmo sem estimulo ou espaço para carregar nas sacolas de nossas viagens os frutos das escritas.  

 

           Garimpando ou fuçando as novas informações sempre tínhamos dados diferentes e novos que completavam as entrevistas realizadas anteriormente. Quanto as descrições dos personagens eram enfatizadas cuidadosamente, não podíamos deixar nenhum detalhe passar em branco, ou seja, sem ser abordado em nossas escritas; assim eram nossas impressões, comentários, opiniões e relatos das atividades pedagógicas, que eram paralelos ao conteúdo da grade curricular preparando os alunos para a cidadania.

            

           Assim, avançava a iniciação a pesquisa no ensino básico médio nos interiores do Estado do Pará, com as Ciências Humanas.