Contos Someanos
Por: Arodinei Gaia*
Toda boca da noite a velha Naná observava da janela de sua casa aquela arrumação. O homem, zanzava de um lado para o outro. Ia, vinha, meio de campo, grande área, lateral, escanteio, pra lá e pra cá, como se procurasse algo no campo de bola.
E a velha senhora inquieta na janela com aquela arrumação. Ela residia no povoado e ele estava trabalho. Aliás! Um pequeno e belíssimo povoado, chamado Vila Martins, plantado no meio da mata cametaense. Todo final de tarde, a senhora, repousava os braços na janela olhando o findo movimento do dia e as pessoas que passavam buscando o refúgio do lar. Era o término das atividades diurnas.
Do outro lado da rua, em frente da casa da mulher, descansava um verde e areial campo de futebol, que ansioso, também, esperava a noite para recuperar as energias consumidas pela famosa 'pelada' da tarde.
Pois bem! Era nesse momento, quando a noite chegava no vilarejo e o breu ocupava o campo, que a senhora notava aquele estranho comportamento do professor Paulo, zanzando, de um lado para o outro, naquele gramado que, ora, dormia.
- Mas o que esse hôme faz tuda nuite nesse campo andando feito varrido? Perguntava pra si dona Naná.
- Reginho ispia meu filho! Mostrava a cena no campo pro rapaz.
Reginho, era estudante do ensino médio modular na localidade e Paulo era seu professor de Educação Física. Não havia nada de errado com ele, o rapaz falava pra mãe.
Porém a senhora não se conformava, e com poucos dias já havia espalhado, a notícia no vilarejo, de que, um dos professores do SOME era varrido ou ‘duidu varridu’ como dizia a senhora. A notícia se espalhou através da própria Dona Naná que, caprichosamente, se encarregou de divulgar a matéria pela eficiente rádio cipó da vila. E o boca boca corria solto no comércio de seu Manduca, na porta da igreja domingo pela manhã, na conversa com a vizinhança.
- Como assim doido?
- Por que? O que ele faz?
- Ele parece normal na aula.
Surgiam as indagações para as desconfianças da senhora vizinha do campo de futebol. Muitos saiam em defesa do professor, outros na dúvida, foram espiar a noite a cena no campo e confirmaram que, realmente, era só o dia ir embora ele cumpria aquele ritual.
- Olha, tuda nuite eu vejo da minha janela, ele aparece na boquinha da nuite no campo andando de um lado pro outro com uma lanterna na mão. Parece percurando arguma cuisa, mas porque não percura de dia? Dona Naná questionava.
O fato parecia estranho mesmo. O que um homem da estirpe dele, distinto como ele, iria fazer no campo no escuro naquele cenário arriscando pisar numa cobra ou apanhar de visagem?
Todos já sabiam do acontecido que era manchete principal na vila, menos o acusado, até que certo dia, caiu nos seus ouvidos por meio de sus alunos. E, finalmente, o mistério foi revelado.
- Rapaz! Sério isso? O mestre indagava assustado e ao mesmo tempo rindo do fato.
- É professor! Dizia um aluno em sala de aula. O senhor está com fama de doido na vila.
- Mas afinal, o que o senhor faz no campo toda noite?
- Verdade professor. Meu pai já viu também. Afirmava outra aluna.
Foi quando o professor Paulo resolveu explicar...
- Calma, calma! É o seguinte. Eu estou recém casado com minha esposa que ficou em Belém. Então eu saio à noite pro campo pra procurar sinal de celular e falar com ela.
- Então é isso?
- Sim. O que mais podia ser. Ou vocês estavam achando também que eu era doido?
Todos riram e o curioso comportamento foi explicado.
O professor Paulo andava de um lado para o outro procurando sinal de celular. O foco da lanterna que a senhora via na mão dele era, simplesmente, a luz do aparelho. E no campo por conta que lá, no espaço aberto, havia mais facilidade de encontrar sinal da vivo. E, justamente, naquele horário, porque não havia ninguém e também para fugir do abrasador sol do dia.
A bem da verdade, muitos professores e professoras do SOME já passaram por isso. Há relatos de mestres que já subiram em galho de árvore, outras que subiram serra a cavalo, ainda os que saiam de canoa pro meio do rio, e os que zanzavam de um lado para o outro na rua ou no campo, como o professor Paulo. Todos em busca de sinal, fazendo até simpatia para que aparecesse algumas torrinhas.
E antes do celular ainda era mais difícil, pois a única forma de comunicação dos professores e professoras com seus familiares era por carta ou na antiga e nostálgica cabine telefônica, em que todos os presentes ouviam a conversa.
Hoje, com a expansão da internet no interior, os professores moduleiros, ou grande parte, estão conectados. Ainda Bem!!
Arodinei Gaia é poeta, ccordelista, compositor, cantor, escritor e professor do Sistema de Organização
Modular de Ensino - SOME (Cametá)
Imagens: Professor Marcelo Palheta e Evanice Castro
Internet: Página Belos Prazeres