* Valdir Ribeiro
É
comum em nossos dias, encontrarmos escritos sobre a região amazônica, seja em
forma de notícias, seja em forma de poesia exaltando e contando história sobre
a região. Nesse sentido identificam-se nos rios, nas matas e nas cidades,
lugares de um espaço discursivo onde a cada instante se criam novas identidades
amazônicas ora pela beleza natural que existe e é vivenciada a todo instante, ora
pela recepção de mensagem que nos é passado por artistas e profissionais de
comunicação. Existem representações aguçadas por pensamentos identitários que
nos colocam na condição de seres amazônicos, pois segundo Edir Augusto 2010 p.
185:
Na
Amazônia constitui-se uma cultura de profundas relações com a natureza, que
perdurou, consolidou e fecundou o imaginário (até o final dos anos de 1950)
destes indivíduos “isolados e dispersos” (...) a construção da identidade é
sempre um processo em curso – não necessariamente longevo e estável – a
identidade é relacional e contrativa: envolve sempre diálogo e conflito, entre
o passado e o presente, entre “nós” e os outros o dentro e o fora.
Este
artigo será trabalhado com poesias musicadas e imagens de autores que nos
proporcionam o gostar pela região, justamente pelas questões culturais,
literária e identitárias amazônicas e nos colocam na condição de seres amazônicos,
pois, estes fatores tem na recepção das mensagens, fatos comuns que acabam nos
envolvendo neste espaço da região brasileira. A escolha deste trabalho veio
também pela vontade de ampliar meus conhecimentos sobre literatura, cultura e
identidade e a teoria do efeito estético na abordagem de Wolfgang Iser não deixando de lado autores que trabalham
com muita criatividade a questão da memória como, por exemplo, Maurice Halbwachs.
Segundo
Edir Augusto 2010 p 204:
Importa,
também, para entendermos o discurso da identidade, que permeia seus textos atentar
para o contexto em que escrevem: intensificação do processo de modernização da
Amazônia (...) implanta grandes projetos de drásticos impactos no ecossistema e
no modo de vida regional.
Aqui será representado pelo texto Saga da
Amazônia:
Era uma vez na AMAZÔNIA,
a mais bonita floresta
Mata verde, céu azul, a mais imensa floresta
No fundo d'água as IARAS, caboclo lendas e mágoas
E os rios puxando as águas
Mata verde, céu azul, a mais imensa floresta
No fundo d'água as IARAS, caboclo lendas e mágoas
E os rios puxando as águas
PAPAGAIOS, PERIQUITOS,
cuidavam das suas cores
Os peixes singrando os rios, Curumins cheios de amores
Sorria o JURUPARI, URAPURU, seu porvir
Era: FAUNA, FLORA, FRUTOS E FLORES
Os peixes singrando os rios, Curumins cheios de amores
Sorria o JURUPARI, URAPURU, seu porvir
Era: FAUNA, FLORA, FRUTOS E FLORES
Toda mata tem caipora
para a mata vigiar
Veio caipora de fora para a mata definhar
E trouxe DRAGÃO-DE-FERRO, prá comer muita madeira
E trouxe em estilo gigante, prá acabar com a capoeira.
Veio caipora de fora para a mata definhar
E trouxe DRAGÃO-DE-FERRO, prá comer muita madeira
E trouxe em estilo gigante, prá acabar com a capoeira.
Fizeram logo o projeto
sem ninguém testemunhar
Prá o dragão cortar madeira e toda mata derrubar:
Se a floresta meu amigo tivesse pé prá andar
Eu garanto meu amigo, com o perigo não tinha ficado lá.
Prá o dragão cortar madeira e toda mata derrubar:
Se a floresta meu amigo tivesse pé prá andar
Eu garanto meu amigo, com o perigo não tinha ficado lá.
O que se corta em
segundos gasta tempo prá vingar
E o fruto que dá no cacho prá gente se alimentar??
Depois tem passarinho, tem o ninho, tem o ar
ICARAPÉ, rio abaixo, tem riacho e esse rio que é um mar.
E o fruto que dá no cacho prá gente se alimentar??
Depois tem passarinho, tem o ninho, tem o ar
ICARAPÉ, rio abaixo, tem riacho e esse rio que é um mar.
Mas o DRAGÃO continua a
floresta devorar
E quem habita essa mata prá onde vai se mudar??
Corre ÍNDIO, SERINGUEIRO, PREGUIÇA, TAMANDUÁ
TARTARUGA, pé ligeiro, corre-corre TRIBO DOS KAMAIURA
E quem habita essa mata prá onde vai se mudar??
Corre ÍNDIO, SERINGUEIRO, PREGUIÇA, TAMANDUÁ
TARTARUGA, pé ligeiro, corre-corre TRIBO DOS KAMAIURA
No lugar que havia mata,
hoje há perseguição
Grileiro mata posseiro só prá lhe roubar seu chão
Castanheiro, seringueiro já viraram até peão
Afora os que já morreram como ave-de-arribação
Zé da Nana tá de prova, naquele lugar tem cova
Gente enterrada no chão:
Grileiro mata posseiro só prá lhe roubar seu chão
Castanheiro, seringueiro já viraram até peão
Afora os que já morreram como ave-de-arribação
Zé da Nana tá de prova, naquele lugar tem cova
Gente enterrada no chão:
Pois mataram índio que
matou grileiro que matou posseiro
Disse um castanheiro para um seringueiro que um estrangeiro
Roubou seu lugar
Disse um castanheiro para um seringueiro que um estrangeiro
Roubou seu lugar
Foi então que um
violeiro chegando na região
Ficou tão penalizado e escreveu essa canção
E talvez, desesperado com tanta devastação
Pegou a primeira estrada sem rumo, sem direção
Com os olhos cheios de água, sumiu levando essa mágoa
Dentro do seu coração.
Ficou tão penalizado e escreveu essa canção
E talvez, desesperado com tanta devastação
Pegou a primeira estrada sem rumo, sem direção
Com os olhos cheios de água, sumiu levando essa mágoa
Dentro do seu coração.
Aqui termina essa
história para gente de valor
Prá gente que tem memória, muito crença muito amor
Prá defender o que ainda resta sem rodeio, sem aresta
ERA UMA VEZ UMA FLORESTA NA LINHA DO EQUADOR.
Prá gente que tem memória, muito crença muito amor
Prá defender o que ainda resta sem rodeio, sem aresta
ERA UMA VEZ UMA FLORESTA NA LINHA DO EQUADOR.
Geraldo Azevedo
A
poesia remete-nos à lembrança de lugares, animais e objetos que fizeram parte
de nossa vida e cria-nos uma aglutinada imagem em nossa mente, lembrando de
detalhes que foram lidos ou vividos e nos recolocam na situação de seres da
Amazônia. Segundo Renato Ortiz p.17 “cada espaço é mareado por valores
particulares e por uma mentalidade coletiva modal, pois uma civilização é uma
continuidade no tempo de larga duração”. No contexto de saga da Amazônia, vê-se
o confronto do processo de autoridade da apropriação da região, sustentada pelo
bem da economia nacional-internacional esmagando quem realmente precisa do
espaço para viver e praticar suas ações culturais.
Michel Pollack (1992,
p.9) afirma em seu livro “Memória, esquecimento, silêncio” “A referência ao
passado serve para manter a coesão dos grupos e das instituições que compõem
uma sociedade, para definir seu lugar respectivo, sua complementaridade, mas
também as oposições irredutíveis.“
Uma
caracterização bem feita é aquela que torna viva a presença de personagens na
imaginação do leitor! Eles não devem ser
personagens quaisquer, mas específicas de determinada história, isto é, devem
ser singulares. Eurídice Figueiredo 1998 falando sobre a obra de Eduard
Glissant que se constroi pelo acúmulo, “pela nomeação extensiva de todo um
espaço-tempo vivenciado por personagens que se repetem de um livro para o outro,
evoluindo, envelhecendo, refletindo, insistido naquela ideia fixa do autor, num
diálogo intermitente, recortado, em que vários alter egos discutem numa duração
interminável.
É
com o intuito de mostrar ao leitor deste artigo as diversas maneiras que temos
de focalizar objetos, seres e lugares que nos fazem reviver tempos distantes ou
não, e que de acordo com outras memórias nos remetem com sensibilidade várias
maneiras de se pensar nas pessoas, na região, na cidade nas ruas entre outras
coisas que guardamos na lembrança e a cada instante mexe em nossa identidade.
Pois segundo Halbwachs (2006, p.72):
Para evocar seu próprio passado, em geral a
pessoa precisa recorrer às lembranças de outras, e se transporta a pontos de
referências que existem fora de si, determinados pela sociedade. Mais do que
isso, o funcionamento da memória individual não é possível sem esses
instrumentos que são as palavras e as idéias, que o indivíduo não inventou, mas
toma emprestado de seu ambiente. Não é menos verdade que não conseguimos
lembrar senão do que vimos, fizemos, sentimos, pensamos num momento do tempo,
ou seja, nossa memória não se confunde com a dos outros.
É notável que a pós-modernidade trouxe com
ela a diversidade identitárias como afirma Bhabha 2003 p.p. 20, 21
a
representação da diferença não deve ser lida apressadamente como o reflexo de
traços culturais ou étnicos
preestabelecidos, inscritos na lápide fixa da tradição. A articulação social da
diferença, da perspectiva da minoria é uma negociação complexa em andamento,
que procura conferir autoridade aos hibridismos culturais que emergem em
momento de transformação histórica.
Atenho-me aqui, a especificidade da vivência
do ser amazônico produtos de interrogações e dúvidas passadas que revitaliza
sua visão de forma a introduzir um pensamento mais forte da região amazônica,
pois, para Bhabha 2003 p.27 “O trabalho fronteiriço da cultura exige um
encontro com o ‘novo’ que não seja parte do continuum de passado e presente.”
Ele cria uma ideia do novo como ato insurgente da tradição cultural. Aqui é
mostrado pela poesia “olhando Belém” de vital lima:
O sol da manha rasga o
céu da Amazônia
Eu olho Belém da janela do hotel
As aves que passam fazendo uma zona
Mostrando pra mim que a Amazônia sou eu
E tudo é muito lindo
É branco, é negro, é índio
No rio tiete mora a minha verdade
Sou caipira, sede urbana dos matos
Um caipora que nasceu na cidade
Um curupira de gravata e sapatos
Sem nome e sem dinheiro
Sou mais um brasileiro
Olhando Belém enquanto uma canoa desce um rio
E o curumim assiste da canoa um Boeing riscando o vazio
Eu posso acreditar que ainda da pra gente viver numa boa
Os rios da minha aldeia são maiores do que os de Fernando Pessoa
( e o sol da manha rasga o céu da Amazônia )
Olhando os meus olhos de verde e floresta
Sentindo na pele o que disse o poeta
Eu olho o futuro e pergunto pra insônia
Será que o Brasil nunca viu a Amazônia
E vou dormir com isso
Será que e tão difícil.
Eu olho Belém da janela do hotel
As aves que passam fazendo uma zona
Mostrando pra mim que a Amazônia sou eu
E tudo é muito lindo
É branco, é negro, é índio
No rio tiete mora a minha verdade
Sou caipira, sede urbana dos matos
Um caipora que nasceu na cidade
Um curupira de gravata e sapatos
Sem nome e sem dinheiro
Sou mais um brasileiro
Olhando Belém enquanto uma canoa desce um rio
E o curumim assiste da canoa um Boeing riscando o vazio
Eu posso acreditar que ainda da pra gente viver numa boa
Os rios da minha aldeia são maiores do que os de Fernando Pessoa
( e o sol da manha rasga o céu da Amazônia )
Olhando os meus olhos de verde e floresta
Sentindo na pele o que disse o poeta
Eu olho o futuro e pergunto pra insônia
Será que o Brasil nunca viu a Amazônia
E vou dormir com isso
Será que e tão difícil.
Assim,
a construção do identitário amazônico se expande mostrando na expressão do eu
poético uma transformação através de espaços e vivências amazônicas.
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