* Valdivino Cunha da Silva
Qualquer avaliação que se faça do
que está ocorrendo hoje no Brasil, corre-se o risco de erro. Mas só erra quem
ousa. Não sou dono da verdade, errar faz parte da tentativa do acerto. A
sociologia ensinou-me a analisar os fatos, mas não me garantiu certezas em
minhas análises, portanto, vamos a elas.
A situação da Presidenta Dilma
ante os fatos que estão ocorrendo ultimamente no Brasil, me faz lembrar a
passagem de um filme que assistir sobre a Revolução Francesa quando um súdito
chega ao Palácio de Versalhes onde o rei Luiz XVI vivia enclausurado, vivendo
outra realidade. O súdito veio dar a notícia dos levantes que estavam ocorrendo
na França. Ele pergunta ao súdito se o que estava ocorrendo na França era uma
revolta. O súdito então lhe disse “não majestade, é uma revolução”. O resto da
história francesa todo aluno que já concluiu o ensino fundamental sabe. O mundo
nunca mais foi o mesmo depois do ano de 1789, ano da Revolução Francesa.
Imagino que quando a Presidenta
soube das primeiras noticias ou viu pela televisão a multidão em marcha, deve
ter perguntado aos seus assessores se aquilo era uma revolução. Eles certamente
disseram que não, que aquilo era apenas uma revolta, portanto, diferente de
revolução, pois esta traz em seu bojo, mudanças radicais, estruturais, enquanto
aquela, expressa apena uma insatisfação de um povo, de uma nação.
As manifestações de insatisfação
custaram demais para acontecer, mas aquele dito popular que diz que “antes
tarde do que nunca” se aplica ao caso brasileiro. Alguns pontos precisam ser
levados em consideração para compreensão das mobilizações que vem ocorrendo, um
deles diz respeito a cooptação pela qual passou as lideranças que foram
formadas nas lutas sindicais, nas associações, nos movimentos sociais ao longo
de muitos anos e que hoje estão nos gabinetes governamentais, viraram
lideranças chapas brancas, surgindo, portanto, um vácuo de novos líderes.
O abismo entre pobres e ricos é
um fato relevante, chega a indignação e contradição. Indignação pelo privilégio
de uma minoria e indignação pelo contraste, pois ao mesmo tempo em que se tem
transporte, saúde, educação e serviços públicos precários, o governo gasta
bilhões para atender aos ditames da FIFA, Federação Internacional de Futebol
sediada na Suíça, país que tem um alto padrão de vida, oposto do nosso. Esse
estado de coisas funciona como combustível e motor de revolta.
Achava que a atual geração
não ia escrever sua história, mas eles
dirão aos seus filhos, que diferentemente de seus pais(no qual me incluo), não
precisaram usar o “boca de ferro” , as assembleias, o corpo a corpo e a
panfletagem para convencer os “companheiros(a)” a ingressarem na luta. Eles
dirão aos seus filhos que o meio de mobilização mais eficiente foi feito pela
internet através das redes sociais, mais especificamente o Facebook. Esta
ferramenta pode até ser questionada quando ao seu poder formador, mas não se
discute sua instantaneidade, muito útil na era globalizada. Essa ferramenta
possibilita encurtar distâncias, pluralidade de opiniões e num só clic une o internautas do norte ao sul, cada um deles
podendo opinar, sem precisar levantar um crachá ou pedir uma “questão de ordem”
ao coordenador da mesa, como no tempo em que militei no movimento social e
sindical.
Outro fato que merece atenção é a
ausência dos partidos políticos. O povo notadamente, os jovens, rejeitaram
veementemente os partidos políticos. Respeito e entendo os porquês de total
repulsa aos partidos políticos. Todos sabem que eles viraram um instrumento de
negócios ilícitos e fonte de corrupção. Mas o mal não está nos partidos e sim
na forma de como ele é conduzido até porque a corrupção não está apenas nos
partidos, muito embora alguns deles não deveriam se quer existir. A corrupção infelizmente
está presente em diversas instituições, sejam elas públicas ou privadas. O que
precisa ser mudado é a sociedade como um todo. Que ela não seja conivente com
esse estado de coisas.
Também
merece uma análise o comportamento das massas e da pauta. das reivindicações.
As massas exerceram o principio da democracia plena, onde o povo age por si
mesmo e sem intermediários (representantes). Ações dessa natureza têm méritos e
desmérito. Mérito pela autonomia, desmérito por ser acéfala, sem norte. Não tem
um foco específico, prova disso é que a revolta começou pelo abuso nos preços
das passagens dos ônibus urbanos e pela precariedade nos serviços prestados e
tomou novos rumos, todos eles justíssimos, fruto de uma indignação e não de uma
ação pensada, aliás, essa é uma das características das massas.
O povo deu um show à parte, em
que pese uma minoria que se aproveitou da situação, furtou e depredou o
patrimônio público. Que quebrassem as vidraças das multinacionais, vá lá, agora, danificar o que é de todos, é lamentável,
mas entra na conta da indignação.
Eu não queria está na pele da
Presidenta Dilma, ela está entre a cruz e a espada (ou entre Deus e o diabo, se
preferirem) pelo fato de que ela é chefe de Estado e o Estado é o responsável
por “garantir a ordem pública e o direito de ir e vir das pessoas e da
propriedade privada, enfim, o Estado tem o monopólio da força e assim pode usar
quando bem entender. Ela está bebendo o
próprio veneno. Foi assim que o partido da qual ela faz parte - PT(e que eu já defendi)
ensinou a fazer, ou seja, ir às ruas e
radicalizar quando necessário fosse.
O Governo da presidenta Dilma tem
falhas, mas tem também seus acertos, porém nem por isso vamos deixar de lutar
por uma vida melhor, por um Brasil mais justo e igualitário. Ela ousou enquanto
chefe de Estado quando foi à televisão e disse que a nação brasileira estava de
parabéns ao ir às ruas reivindicar direitos; Ela foi fiel a sua história de
ex-presa política.
Assim como a primavera Síria, o
verão brasileiro nunca mais será o mesmo. O sol escaldante de verão, mexeu com o
comodismo do povo brasileiro. Cansamos de ficar “deitado eternamente em berço
esplêndido” e partimos para uma luta, um tanto quanto desigual, mas que já tem
alguns significados importantes a serem contabilizados como é o caso da
rejeição da PEC 37 que pretendia excluir através de Emenda constitucional o
Ministério Publico das investigações criminais que iria contribuir ainda mais
para a impunidade. Outro avanço importante como fruto das vozes da rua foi que
entrou na pauta de votação do Congresso Nacional projeto que considera a
corrupção como crime hediondo, o que destinou 75% dos royalties do petróleo e do gás natural para a
educação e 25% para a saúde, enfim, está na pauta de discussão do Congresso
Nacional, projetos importantes que pelo
visto agora serão votados de maneira mais rápida e transparente e que vão ao encontro dos anseios da
população. Não se sabe ao certo até quando essas manifestações durarão, o que é
certo é que podemos dividir a dinâmicas
das lutas sociais em dois momentos: antes e depois da revolta dos centavos.
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