*José Ribamar Lira de Oliveira
Minha história no Some- Bujaru
Dos inúmeros municípios que trabalhei
(já estou na reta final de trabalho) por este Pará afora, Bujaru, foi sem
dúvida, aquele município em que passei a maior parte de tempo de minha vida
docente. Já sinto uma pitada de saudade, saudade dos alunos, dos companheiros
de labuta e da comunidade como um todo, mas enquanto os noventas dias que
antecedem a aposentadoria não chega, vou contando um pouco da história que vi,
senti e vivi.
A partir de 2003, tendo como uma
das principais finalidades a expansão de oportunidades na área educacional,
especifico no ensino médio, do Estado do Pará, a Secretaria de Educação do
Estado do Pará – Seduc, passou a oferecer o Sistema de Organização Modular –
Some, nas localidades do município de Bujaru, para os estudantes filhos de
trabalhadores rurais, ribeirinhos e quilombolas. Foi um passo importante no que
diz respeito a educação naquele município.
A grande responsável pela a
implantação do Some em Bujaru, foi sem dúvida a professora Iracema Heitor, que
naquela época era a Diretora da Escola Polo “Dom Mário de Miranda Vilas Boas”.
Ela nos conta que em 2001 houve a solicitação, conforme Ofício nº 069/2001, de
17 de maio de 2001, com assinaturas do Prefeito Miguel Bernardo da Costa,
Secretaria Municipal de Educação Rosângela Maria Vasconcelos Gomes e ela, para
implantação do Sistema de Organização Modular de Ensino – Some, para o ensino
médio, no município. E a exposição de motivos da implantação enviada para
Secretaria Estadual de Educação, aos cuidados da responsável pelo projeto
Professora Nádia Eliane Cortez Brasil, do Departamento do Some, diz o seguinte,
no primeiro parágrafo: ”A implantação do Projeto SOME em nível de ensino médio,
faz-se necessário pelo fato de que nosso município conta hoje com um quadro de
7.310 alunos da rede municipal de ensino, sendo que 5.160 destes alunos se
encontram na Zona Rural. A esse número soma-se ainda 79 alunos que pertencem ao
quadro do Estado, são alunos que cursam o ensino médio e precisam deslocar-se
todos os dias de suas casas, alguns saem 03h00min horas (Manhã) para apanhar o
transporte escolar e chegar até a sede do município”. A exposição frisa também
que em virtude do crescimento de alunos o transporte escolar já não contemplava
confortavelmente toda clientela atendida, proporcionando a superlotação dos
ônibus e fazendo com que os alunos corram riscos diante de tal situação.
A Professora Iracema Heitor,
enfatiza na entrevista, que com a implantação do Some em Bujaru, em 2003, ficou
o gerenciamento em um primeiro momento com a Prefeitura Municipal, que só após
o desmantelamento do Some pela então Secretaria estadual de Educação Rosa
Cunha, quando retirou 60% da gratificação de deslocamento , passagens de
aviões, material didático, Convênio com municípios entre outros é que o Some
passou ser gerenciado pela Escola Sede, ou seja, só a partir do segundo
semestre. Naquele momento, saíram do Some, 192 Professores, por não concordar
com a política autoritária e nefasta para a educação do Estado, inclusive, eu.
E continua, o Ofício foi enviado solicitando a implantação das localidades de
Ponta de terra (24 alunos), Km 29 (Com 29 alunos), São Raimundo (60 alunos),
São Sebastião (29 alunos), São Lopes (32 alunos), Santana (15 alunos) e Santa
Maria (34 alunos). Mesmo com a solicitação de sete localidades, com números
suficientes de demanda, a SEDUC só liberou dois polos que foram de São Raimundo
e da Curva. As outras localidades foram sendo implantadas gradativamente, menos
a Vila Santana e Santa Maria, que até o momento não foram liberadas. Os alunos
de Santana se deslocam para o Km 29 para estudar. A informante ressalta através
de documentos a solicitação para implantações do Some no município e a
importância da Casa dos Professores.
A outra pessoa ouvida sobre a história
da implantação do Some em Bujaru, foi a ex-coordenadora e também ex-professora
do Some, Simone Soares Sampaio, que nos conta que o Sistema de Organização Modular de Ensino –
Some em Bujaru foi implantado em 2003, em dois polos, na Curva e São Raimundo,
funcionando só com primeiro ano e gradativamente foi aumentando as turmas e em
2005 completou as séries seguintes”. E Continua: “A partir de 2006 o número de
polo aumentou, sendo implantado nas localidades de São Sebastião, São Lopes,
Providência e Ponta de Terra, sendo iniciado na localidade de Traquateua em 2007
e no Km 20, que era chamado de Providência II, como se fosse a extensão do polo
de Providência, já que os números de turmas eram bastante pequenas”. Neste
período na Direção da Escola Sede estava a Professora Iracema Heitor.
Na localidade de Ponta de Terra o
Some foi extinto em 2013 em função do descompromisso da Direção da Escola D.
Mário com a comunidade. Esta, não desejava a extinção do Some, pois prejudicou muitos
alunos e alunas, já que com a implantação do regime regular o quadro de
docentes não estava completo e sendo a maioria contratados diferente dos
educadores do Some, que eram professores concursados e efetivos, sendo muitos
possuindo especializações e mestrados. Sinceramente até hoje não se entendeu os
reais interesses que levaram a exclusão do Some nesta comunidade. (grifos meus)
Na época o quadro de professores
do Some era completo, sendo um dos pioneiros o Professor de Espanhol e Língua
Portuguesa Railson Fernandes Elmescany e a Professora Nazaré Laurido, de Língua
Portuguesa. Segundo o Professor Railson, nos polos que tinham neste momento que
era São Raimundo e Curva passaram dois professores que eram: Enock, de
matemática e o França de Geografia. E continua, neste período foi cortada a
gratificação, ficando dividida, e as duas localidades ficavam com 60% da
gratificação, o que fez com que o professores parassem de trabalhar, sendo
contratado para trabalhar no KM 29, Curva, com algumas turmas, sendo sua
primeira localidade de trabalho pelo Some, com as mesmas dificuldades que ainda
temos hoje, como as casa para professores ficarem para se ter ideia das
dificuldades, nos dois primeiros anos que trabalhou na Curva, o professor
Railson dormia numa maca, inclusive, algumas vezes quando retornava à noite das
aulas, geralmente, encontrava sangue no corredor, provavelmente, D. Graça tinha
feito algum curativo, neste momento era sujeito a aceitar essa situação até
porque era novo e precisava trabalhar. O informante, ressalta que em São
Raimundo a Diretora era Conceição Veras e no 29, a Nilcelene. Railson, diz que,
com a chegada do novo Prefeito Emanoel Muniz, solicita a ampliação de novos
polos a partir de 2005 e chegando novos professores, como Célia Machado, de
Biologia; ele, Denis Heitor, de Matemática, João Wanzeller, de Matemática;
Girvânia Mesquita, de Geografia. Na entrevista, realizada no dia 12 de maio de
2018, frisou um dado cômico de sua experiência no Some nesses quinze anos, que
aconteceu na localidade de São Raimundo, em 2003, naquele momento não tinha
energia e trabalhava com a disciplina de Artes, sobre as atividades pedagógicas
voltadas para lendas e mitos da região, e falava-se muito em Matin, Curupira e
outras lendas. Quando foi numa certa noite, segundo o linguajar dos moradores,
foi “amassado” pela Matinta Pereira e Matin, já que não conseguia falar, não
conseguia se mexer e assim aconteceram outras vezes. Finalizando sua conversa,
abordou que com a expansão do Some, a partir de 2005, o Some assume o ensino
fundamental em São Raimundo e Ponta de Terra e aumentando o número de alunos.
Hoje, o Some atende apenas o Ensino Médio, finaliza o professor.
O último entrevistado deste
artigo é o professor de sociologia Valdivino Cunha que em resposta minha
pergunta se podíamos marcar a entrevista, mandou-me o seguinte texto que publico
aqui na íntegra:
Minha história de docência tem
uma relação histórica e prazerosa com o Some e com o município de Bujaru
concomitantemente, que aliás, foi lá onde comecei e permaneço até hoje e não
tenho pretensões de sair de lá até que o tempo de aposentar chegue, daqui a
pouco mais de um ano. Iniciei minhas atividades docentes pelo polo São
Raimundo, quando a professora Iracema Heitor ainda era a diretora do D. Mário
que é nossa sede. Foi lá que encontrei pela primeira vez o Professor Railson e
a professora Celia Machado. Depois conheci outros professores dos quais me
tornei amigo muito próximo, como é o caso dos professores Lásaro e Valdecir,
das professoras Adriana e Rose Mary, entre outros.
Você me faz três perguntas em se
tratando do Some e de Bujaru. Vou respondê-las. As perguntas foram:
- De que eu mais gosto do que eu
não gosto no que diz respeito ao Some e ao município de Bujaru?
- Que medidas eu tomaria pra
melhorar a educação de Bujaru?
Vou tentar responder, mas isso
não significa que tudo aconteceria num toque de mágica, teria todo um
planejamento, uma metodologia. Vamos lá.
O que eu mais gosto de Bujaru, é
a forma como eles me acolhem. Os bujaruenses são acolhedores, adoro aquela
gente e eles têm por mim um carinho sem medida. A recíproca também é verdadeira.
O que eu não gosto em Bujaru?
É a escalada violência. Ela
extrapolou os limites toleráveis. Ninguém mais vive sossegado, seja na cidade
ou nas comunidades, eu mesmo já fui assaltado e furtado duas vezes. Tem que
haver um basta. A solução passa necessariamente pelo o envolvimento da
comunidade para a amenização desse problema tão devastador. Não gosto também de
saber que há professor que não tem nenhum compromisso educacional e estão no
Some apenas por questões financeiras e assim eles denigrem nossa imagem, isso
eu também não gosto. É preciso separar o joio do trigo.
- Que medidas eu tomaria para
melhorar a educação de Bujaru?
No tocante as medidas de
melhorias da educação em Bujaru, não seria tão fácil assim, mas eu se poderes
tivesse, injetaria um maior volume de recursos financeiros na educação. Esse
aporte de recursos seria injetado no sentido de melhorar o exercício da
docência, garantir a universalidade e a qualidade da merenda escolar.
Melhoraria também a infraestrutura (incluindo a casa dos professores do Some)
das escolas e o transporte escolar. Faria um grande seminário com todos os
segmentos envolvidos com a educação de Bujaru para levantar e hierarquizar as
demandas. Minha Secretária Municipal de Educação seria a professora Iracema
Heitor, pois ela é educadora e tem currículo invejável nesta área e conhece
como poucos a problemática educacional de Bujaru.
Você me perguntou ainda,
professor Ribamar, o que me deixa orgulhoso no tocante ao Some de Bujaru. Diria
que pertencer a esta importante política pública inclusiva, já me deixa muito
orgulhoso. Agora concretamente, fico muito feliz quando vejo que de vez em
quando há alunos do Some de Bujaru que são aprovados nos vestibulares. Isso
comprova a importância do Some para as localidades interiorizadas deste Pará e
faz dela uma das políticas públicas mais inclusiva. Dias desses, numa
culminância que fizemos do seu trabalho de pesquisa oral lá em Concórdia,
fiquei sabendo que uma aluna do Some de lá fora aprovada em Medicina. Isso é
ótimo e ao mesmo tempo raro um pobre entrar numa faculdade de uma medicina e o
Some possibilita isso. Não é maravilhoso? Também fico muito feliz quando
encontro ex-alunos nossos que já são professores, é sinal que a semente vingou
e deu frutos. Viva os 38 anos do Some!
Nesses 15 anos de implantação do
Some, no município de Bujaru, podemos observar que esta modalidade de ensino
deu uma grande contribuição e desenvolvimento para o município.
O Some que inicialmente foi
implantado, no ano de 1980, em quatro municípios, foi expandido no Estado do
Pará, em 2003, chegando em 79 municípios, sendo 47 sedes e 122 distritos,
totalizando 169 localidades, aglutinando em 35 circuitos, distribuídos em 10
polos, que era, os seguintes: Tucuruí, Cametá, Marabá, Conceição do Araguaia,
Abaetetuba, Igarapé-Miri, Santarém, Altamira, Óbidos e Itaituba.
Ressalto que com ocorrência
anotada em 2005, a Secretaria Estadual de Educação do Estado do Pará – Seduc,
através da portaria 064/05, definiu a classificação dos municípios e
localidades pelas categorias A B e C considerando o nível de dificuldade de
acesso às localidades, nos termos estabelecidos pelo decreto nº 390/2003, 30%,
60% e 100%, o que abalou consideravelmente a renda familiar dos educadores.
Em 29 de abril de 2014, através
da Lei nº 7.886, o Sistema de Organização Modular de Ensino – SOME foi
estabelecido como Política Pública Educacional do Estado do Pará, no âmbito da
Secretaria de Estado de Educação.
Atualizando as informações do
Some, em 2018, segundo a Coordenadora do Some em Bujaru, Maria Eliete da Silva
Mesquita, que são as seguintes:
No POLO CURVA/ KM 29: 5 TURMAS
ATIVAS, sendo o 1º: 2, 2º: 1 e 3º: 2,
com um quantitativo de alunos de 154; POLO SÃO LOPES: 3 TURMAS ATIVAS, sendo
1º: 1, 2º: 1 e o 3º: 1, com 60 alunos; POLO SÃO RAIMUNDO: 6 TURMAS ATIVAS,
sendo 1º: 2, 2º: 2 e o 3º: 2, com um total de
189 alunos; POLO TRAQUATEUA: 3 TURMAS ATIVAS, 1º: 1, 2º: 1 e a 3º:1, com
82 alunos; POLO SÃO SEBASTIÃO: 4 TURMAS
ATIVAS, 1º: 2, 2º: 1 e a 3º: 1; POLO PROVIDENCIA : 3 TURMAS ATIVAS, sendo 1º:
1, 2º: 1 e a 3º: 1, 47 alunos.
Informantes:
Iracema Heitor da Silva
Maria Eliete da Silva Mesquita
Railson Fernandes Elmescany
Simone Soares Sampaio
Valdivino Cunha da Silva
*O autor é educador da 11ª URE,
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