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sexta-feira, 2 de março de 2012

PERCURSO GERATIVO DE SENTIDO NA MUSICA HOMEM ARANHA DE Jorge vercilo



                                                                              Valdir Guilherme *
     
 
Eu adoro andar no abismo
Numa noite viril de perseguição
Saltando entre os edifícios
Vi você
Em poder de um fugitivo
Que cercado pela polícia
Te fez refém lá nos precipícios
Foi paixão à primeira vista
Me joguei de onde o céu arranha
Te salvando com a minha teia
Prazer, me chamam de Homem Aranha
Seu herói
Hoje o herói agüenta o peso das compras do mês
No telhado ajeitando a Atena da TV
Acordado a noite inteira pra ninar bebê

Chega de bandido pra prender De bala perdida pra deter
Eu tenho uma ideia: você na minha teia
Chega de assalto pra impedir seja em Brasília ou aqui
Eu tive a grande ideia: você na minha teia
Hoje eu estou nas tuas mãos
Dessa sua ingênua  sedução que me pegou na veia
Eu “tô” na tua teia.

O estudo da semiótica greimasiana utiliza-se do Percurso Gerativo do Sentido para realizar sua percepção e fazer com bastante eficácia uma exploração de um texto. Junto com outros aspectos tem-se nestes elementos discursivos uma ferramenta fundamental para análise semiótica. Uma descrição de cada etapa do percurso dar-se-á e mostrar-se-á sua aplicação sobre a narrativa escolhida. Meu interesse, neste trabalho, é o aprimoramento, dentro da semiótica, do Percurso Gerativo de Sentido para que eu possa utilizar este elemento de estudo para desenvolver outros trabalhos e visualizar o discurso emocional do eu poético existente em outras narrativas.
Esta análise versará sobre a visão do universo passional do sujeito e sua relação de tensividade na canção de Jorge Vercilo Homem Aranha.
A narrativa é uma prosa lírica que trata do emocional do eu - lírico (sujeito poético), e possui uma moral filosófica em seu desfecho.  O texto desenvolve-se atrelado a um fato ocorrido com o sujeito poético; o herói (homem aranha) que salva das garras de um bandido uma vítima pela qual nutre um sentimento de paixão “foi paixão à primeira vista”.
Para o desenvolvimento da análise, faz-se necessário algumas definições, tais como a relação entre actante-sujeito e objeto-valor, e o seu estado passional. Mas, abordaremos cada uma delas, nos níveis correspondentes do percurso gerativo do sentido.
1-Nível das Estruturas Fundamentais
O nível fundamental de um texto é caracterizado pelas categorias semânticas que se determinam nas oposições semânticas das quais construirá a continuidade de sentido. Os termos mantêm uma relação de contrariedade e podem adquirir um aspecto positivo ou negativo, dependendo de qual for o enfoque da pesquisa.  De acordo com Fiorin (2006, p.21), “o nível fundamental abriga categorias semânticas que estão na base de construção de um texto”. Nesse sentido, é preciso que os elementos tenham algo em comum para que as diferenças sejam estabelecidas. Podemos citar como exemplo as oposições herói versus bandido, presentes no texto em questão, examinamos que a oposição semântica da qual se constrói a continuidade de sentido do texto, é caracterizado pelas palavras:
herói   vs  bandido
Os percursos que ocorrem no texto é passado do herói ao bandido através da vítima:
herói  -------------------              não herói     ------------------------       bandido
(homem aranha)                    (vítima)                                           (fugitivo)
Esta oposição está diversificada no texto em estudo: “prazer me chamam de homem aranha”, “seu herói”, “vi você em poder de um fugitivo”, “chega de bandido pra prender”, “chega de assaltos pra impedir”.
Estas categorias fundamentais em estudo serão consideradas como positivas ou eufóricas (herói) e negativas ou disfóricas (bandido), assim Teremos: EUFORIA X DISFORIA O texto traz claramente expresso esta contrariedade, sendo o herói eufórico e o bandido disfórico. Esses valores não são determinados por um sistema axiológicos, ou seja, por aquilo que julgamos como certo ou errado, como positivo ou negativo. Assim, o que determina a euforia ou a disforia é o modo como os elementos que compõem a oposição semântica são determinados pelo texto.
2.Nível das Estruturas Narrativas
Segundo Diana Barros (2005:09), esse nível é o responsável pela organização da narrativa “através do ponto de vista de um sujeito”. Nesse sentido, a autora afirma que há um “fazer transformador de um sujeito que age sobre o mundo através de objetos de valores” (p.16). “eu adoro andar no abismo” “saltando entre os edifícios”. No nível narrativo podemos identificar os valores assumidos pelos sujeitos através das oposições semânticas. Este nível é, também, caracterizado pela transformação de estados, ou seja, a narratividade, um dos elementos que constitui a estruturação do sentido.  O herói é localizado pela ação do sujeito que faz do salvamento de vítimas parte de sua rotina “numa noite viril de perseguição (...) vi você”. O sujeito salvador cumpre os valores que são, a ele, destinados. Depois aparece o bandido trazendo valores contrários ao do herói, o que é expresso na narrativa pelo trecho “no poder de um fugitivo, que cercado pela polícia te fez refém lá nos precipícios”. 
A sintaxe da narrativa é composta por enunciados de estado e de fazer. O enunciado de estado está relacionado a um fazer determinado pela relação entre sujeito e objeto que transforma o mundo. Esse fazer “te salvando com minha teia”, denominado junção, une o sujeito (herói) ao objeto (você) e essa relação pode ser de conjunção ou de disjunção.
Para Greimas a sustentação que a criação desse imaginário (do parecer no ser) é devido a dois conceitos — os de tensividade e de foria — que predomina no actante-sujeito passional. Neste texto de Jorge Vercilo, analisaremos o estado de tensividade do actante-sujeito. Mas, para que isso aconteça é necessário definirmos a tensividade como um dos elementos da análise semiótica, e entender esta tensividade ao estado de transformação do sujeito do discurso, ou seja, “o sujeito do “dito” discursivo é capaz de interromper e de desviar sua própria racionalidade narrativa para emprestar um percurso passional, ou mesmo, acompanhar o precedente, perturbando-o por suas pulsações discordantes”. (GREIMAS, 1993:17). È como o próprio actante-sujeito insinua nos seguintes trechos “hoje o herói agüenta o peso das compras do mês”, “no telhado ajeitando a antena da TV”, “acordado a noite inteira pra ninar bebê”
O conceito de tensividade transcende a instância da enunciação discursiva e poderá verter-se no lado imaginário e, é neste ponto que o sujeito poderá encontrar outras formulações, ou seja, o ser herói se apega (tensão passional) a um objeto-valor para refletir sobre algo e/ou determinado elemento que o intriga (que provoca curiosidade). O actante-sujeito mergulha no profundo do Percurso Gerativo de Sentido e quando alcança a eliminação dessa tensão, será o ponto-limite do herói e o não herói.
3-NÍVEL DISCURSIVO
No nível discursivo os níveis fundamentais e narrativos são assumidos pelos sujeitos da enunciação. Desse modo, o nível discursivo também é constituído por sintaxe e uma semântica próprias, mas que será, de acordo com o modelo semiótico, a entrada da teoria enunciativa nos princípios semióticos o que, de acordo com Arnaldo Cortina e Regina Coelho Marchezam (2003) passou a ser representada pelas categorias de embreagem e debreagem. Seguindo então o modelo semiótico, faremos uma breve análise do nível discursivo da música em questão. Como ponto de partida ao estudo, observemos a sintaxe discursiva.
Sintaxe discursiva
Ao tratar da sintaxe discursiva, Diana Luz Pessoa de Barros (2002, p.54), pontua que cabe à “sintaxe do discurso explicar as relações do sujeito da enunciação com discurso-enunciado e também as relações entre enunciador e enunciatário”, relação essa que, de acordo com Fiorin, ocorre em categorias de pessoa, tempo e espaço. Nesse sentido é preciso esclarecer que enunciação pode ser entendida como a materialidade entre a língua e a fala ou de acordo com Greimas e Courtes (1989, p.146) “instância de mediação que assegura a colocação em enunciado-discurso das virtualidades da língua”. Além da enunciação, entende-se como enunciador “o destinador implícito da enunciação” (op.cit) e o enunciatário “corresponderá ao destinatário implícito da enunciação” (op.cit) A primeira categoria de pessoa é representada pelo eu, tu, ele em que o eu e o tu são pessoas presente na própria enunciação, pois trazem consigo aqueles que fazem parte do processo enunciativo, enquanto o ele está fora dessa relação: é elemento material que constitui a enunciação por meio de uma relação indireta, ele não fala no enunciado. Na música em estudo, pode-se dizer que o eu é representado pelo narrador (herói); o tu é a vítima e o ele é representado ora pelos objetos que o sujeito construiu, ora pelo bandido. As marcas do eu ocorrem pelas debreagens enunciativas, ou seja, procedimento pelo qual o autor deixa “aparecer no texto” às marcas de pessoa (eu), tempo (hoje, à noite) e lugar (edifícios, telhados, precipícios).
Em Homem Aranha, o narrador descobre que ser herói, nos tempos atuais, não é só salvar vítimas e enumera ações do herói moderno: “o herói agüenta o peso das compras do mês”, “no telhado ajeitando a Atena da tevê”, “acordado a noite inteira pra ninar bebê”. O sujeito poético reflete sobre o fato ocorrido, e percebe que foi seduzido por quem salvou. Porém, se deixa iludir também e descobre que está preso pelo seu instrumento de salvamento a teia que simboliza ligações (hoje eu estou em suas mãos) e faz tudo para permanecer ligado à vítima, (eu ‘tô’ na sua teia) mesmo que isto seja apenas um ato imaginativo.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio da análise feita, podemos observar que os três níveis de estruturação do sentido (fundamental, narrativo, discursivo) se complementam. Pois o da narratividade precisa de vestimenta do discursivo, e o nível fundamental nada mais é do que o das oposições semânticas básicas do texto. Este é à base do narrativo e do discursivo. Os três juntos formam a significação do texto.
Podemos, também, observar que questões relativas ao salvamento e a tensividade do sujeito implicam diretamente a significação textual, bem como constroem a continuidade de sentido. 
Seria importante, portanto, que a análise semiótica devesse ser entendida e aplicada como meios de interpretação e compreensão textual, principalmente em escolas do ensino fundamental e médio, cujo objetivo será formar alunos capazes de compreender subjetivamente os processos e exercer suas funções críticas na realidade social em que estão inseridos. 

REFERÊNCIAS
BARROS, D. L. P. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 2001.   672
_____.  Teoria do discurso: fundamentos semióticos.  São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 2002.
BORBA, F.S. Introdução aos Estudos Lingüísticos. Campinas, SP: Pontes, 14ª. Ed., 2005.
FIORIN, J.L. Elementos de análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2001.
__________,& SAVIOLI, F.P.  Para entender o texto: leitura e redação. 7º ed. São Paulo: Ática , 2000.
GREIMAS, A.J. & FONTANILLE, Jacques.  Semiótica das paixões: dos estados das coisas aos estados da alma. Trad. Maria José Rodrigues Coracini. São Paulo: Ática, 1993.

    * O autor é Mestre em Comunicação, Linguagem e Cultura - UNAMA. 

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